Aida Franco de Lima – OPINIÃO
A vergonhosa decisão da Justiça Federal mineira em absolver, na vara criminal, os acusados pelo gravíssimo crime ambiental que houve após o rompimento da barragem do Fundão, em Mariana, no ano de 2015 soa como um aval para a impunidade. A decisão foi publicada na madrugada desta véspera de feriado da Proclamação da República. Foram 19 vítimas fatais e mais de 40 municípios atingidos na Bacia do Rio Doce. A Justiça Federal absolveu as empresas Samarco, Vale, VogBR e BHP Billiton, e mais 7 pessoas, entre elas diretores, gerentes e técnicos. O Ministério Público irá recorrer.
A decisão se justifica pelo fato de não ter sido possível definir o envolvimento direto e individual de cada acusado, gerando uma “ausência de provas suficientes para estabelecer a responsabilidade criminal” conforme a decisão judicial do Tribunal Regional Federal da 6ª Região, de Ponte Nova, na Região da Zona da Mata.
No ano de 2016 o Ministério Público Federal denunciou as empresas Samarco, Vale, BHP e VogBR e mais outras 21 pessoas por envolvimento direto com o rompimento, que gerou mortes, lesões corporais e danos ambientais. Entre as denúncias, estaria a manipulação de documentação destinada a órgãos ambientais e o fato de os responsáveis, mesmo ciente dos riscos, optarem por local menos seguro para construção da barragem. Ao longo do tempo o processo travou por vários motivos, desde o fato de o STF -Supremo Tribunal Federal ter que definir a competência da Justiça Federal em julgar o caso até a anulação de provas, porque a defesa dos réus alegou que houve escuta telefônica ilegal.
A jornalista Cristina Serra, que escreveu o livro Tragédia em Mariana: A história do maior desastre ambiental do Brasil, que apenas na Rede Globo trabalhou por 26 anos, emocionou-se ao comentar a notícia durante programa ao vivo no ICL Notícias. Desculpou-se por deixar a emoção tomar conta, e declarou sua indignação diante de tamanho crime ambiental que até hoje não puniu os responsáveis.
Em relação à reparação financeira, no último dia 06 o Supremo Tribunal Federal (STF) homologou um novo acordo para ressarcir os danos, em um total que destina R$ 132 bilhões em dinheiro para ações de reparação e compensação. De acordo com a assessoria do Planalto, o documento foi assinado pelas empresas Samarco (responsável pela barragem do Fundão), Vale (brasileira) e BHP Billiton (anglo-australiana), que controlam a Samarco, e pela Advocacia-Geral da União (AGU), governadores de Minas Gerais e Espírito Santo, Procuradoria-Geral da República (PGR) e Defensoria Pública da União, Ministérios Públicos de MG e do ES e Defensorias Públicas dos dois estados.
Os valores citados, mais outros 8 bilhões destinados a fundo de reserva para indenizações a entidades e municípios não contempladas, começam a ser pagos 30 dias após a homologação. Porém, as empresas terão carência de 20 anos para finalizarem os pagamentos. Tais valores não irão diretamente a moradores atingidos, mas às instituições jurídicas.
Diretamente aos indivíduos prejudicados pelo rompimento as empresas estimam que serão cerca de 300 mil pessoas que podem ser indenizadas no valor individual de R$ 35 mil, desde que provem que se enquadrem nos critérios estabelecidos. Para pescadores e agricultores familiares, o valor da indenização será de R$ 95 mil.
Mais uma vez, estamos diante de um dano imediato, em que comunidades inteiras foram devastadas, em que o meio ambiente sofreu um dano incalculável, cujo tempo para o reparo consome décadas. Se não haverá responsabilidade criminal, mas haverá comodidade para desembolsar o dinheiro, o recado parece claro. O risco em arriscar vidas, compensa.
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