Demanda por atendimento cresce nos Centros de Atenção Psicossocial. Problemas relacionados a adolescentes preocupam profissionais de saúde.
Uma outra pandemia assola a vida de muitos brasileiros neste início de século: a da saúde mental. Em Foz do Iguaçu, a realidade não é diferente. A demanda por atendimento aumentou nos Centros de Atenção Psicossocial da cidade, os CAPs, e serve de alerta para as futuras ações da sociedade. Casos de violência doméstica, abuso sexual, consumo de álcool e de drogas e tentativas de suicídio dispararam.
Em Foz do Iguaçu, as três unidades de CAPs tiveram aumento no fluxo de pacientes neste período de pandemia da covid-19. No CAPs Infantojuvenil, que recebe pessoas de até 18 anos, o atendimento de casos envolvendo tentativa de suicídio ou pensamento suicida se tornou mais frequente.
A maior parte dos atendimentos abrange suicídio, seguido de transtorno de comportamento e uso de drogas, explica o coordenador da unidade, Antonio Batista Santana Júnior. Atualmente, 260 pacientes atendidos foram diagnosticados com risco de tirar a própria vida, a maioria na faixa etária de 13 a 14 anos. A unidade atende hoje cerca de 800 adolescentes, incluindo aqueles que apresentam deficiência intelectual ou são usuários de drogas.
Na avaliação de Antonio, o fechamento das escolas durante o período da pandemia contribuiu para essa realidade, até porque muitas crianças ficaram mais tempo em casa, fato que também está associado ao aumento de abuso sexual e violência doméstica.
Situação semelhante ocorre no CAPs Álcool e Drogas Solidariedade – AD. A coordenadora, Guaracy Lopes Anesi, verificou intensificação na procura pelo serviço, no entanto também atribui parte desse volume às restrições de circulação impostas durante o isolamento, o que impediu a unidade de prestar certos serviços, a exemplo de trabalhos em grupo. “Nós tivemos aumento de cerca de 30% na demanda”, informa Guaracy.
Ela diz ter notado também maior procura pelo serviço por parte da população de rua. Para os moradores que não têm laços com a família e casa para viver, há uma unidade de acolhimento que funciona como moradia transitória. No entanto, as dez vagas estão preenchidas e há fila de espera.
O CAPs AD recebe exclusivamente dependentes químicos, incluindo usuários de drogas lícitas e ilícitas. A maior parte dos casos está relacionada ao uso de álcool e cocaína. Atualmente, a unidade, que funciona de segunda a sexta, atende diariamente cinco pessoas que apresentam transtorno associado à utilização de drogas e álcool. Uma associação explosiva comum entre os pacientes atendidos é o consumo de bebidas alcoólicas seguido de cocaína, usada para tirar o sono.
Tratamento
As pessoas que precisam de ajuda podem procurar as unidades de saúde e em alguns casos, envolvendo uso de droga e suicídio, ir diretamente aos CAPs. Quando o interessado procura ajuda, o tratamento tem resultados significativos e engloba desde psicoterapia a grupos de socialização. O índice de recuperação é alto, de acordo com Antonio.
Em relação aos dependentes químicos, é feito um atendimento inicial e elaborado um plano terapêutico. Os pacientes que desejam fazer o tratamento com total abstinência são encaminhados para uma comunidade terapêutica que tem convênio com a prefeitura. Atualmente, apenas uma unidade mantém convênio com o município porque está com a documentação em dia. No entanto, o atendimento, com duração de nove meses, é exclusivo para homens, pois na cidade não há instituições disponíveis para acolher mulheres.
Riscos
O suicídio é a terceira principal causa de morte entre adolescentes de 15 a 19 anos. O comportamento suicida está associado a alguns transtornos mentais, cujos principais são: depressão, transtorno bipolar, dependência de álcool e droga e a própria esquizofrenia. “Já é um desfecho de um problema emocional grave”, diz Luziânia Medeiros, psicóloga e facilitadora do Método Friends para prevenção de ansiedade e depressão infantojuvenil.
O comportamento suicida é um fenômeno complexo e multifatorial, e nessa condição de pandemia o sentimento de desesperança e solidão tem agravado muito, revela a psicóloga. “O adolescente não tem os mesmos recursos cerebrais cognitivos que um adulto tem para enfrentar um problema, uma adversidade na vida. Ele já está em desvantagem em relação ao processo biológico.”
Luziânia frisa que a própria adolescência é um momento da vida de muita mudança, do ponto de vista fisiológico, cerebral e social, o que deixa a pessoa mais vulnerável. Entre os fatores de risco para o comportamento suicida estão a violência doméstica, bullying, ciberbullying, condições financeiras, de saúde física e luto relacionado à perda de entes queridos, fato que aumenta a ansiedade. Também incluem uso do álcool e droga e episódios de abuso na infância.
Um alerta que a profissional faz é para não se minimizar o relato de adolescente ou de alguém que queira tirar a própria vida, porque há um mito segundo o qual as pessoas que falam não chegam a praticar o suicídio. Ao contrário, muitas delas que praticaram o ato há haviam dado sinais para amigos e familiares. Por isso é preciso fazer uma escuta atenta.
Para identificar possíveis problemas relacionados aos adolescentes, Luziânia recomenda observar se há irritação e agitação excessivas e recorrentes, sentimento de tristeza e baixa autoestima, sensação de impotência, relatos de humilhação, agressões verbais, uso de álcool ou drogas, ou inquietação da própria sexualidade e posts em redes sociais sobre depressão ou suicídio.
Ajuda
Para ajudar, é importante o adolescente ter alguém da confiança dele com quem conversar. Em geral, a pessoa não quer falar porque será julgada, daí a importância de haver uma escuta empática por parte de alguém.
A escola, de modo geral, está mais preparada para isso, contudo há um problema porque mais de 90% dos educadores sofrem de burnout – esgotamento mental.
Progressão no número de atendimentos de pacientes com risco de suicídio no CAPs Infantojuvenil
2017 – 37
2018 – 61
2019 – 130
2020 – 221
2021 – 260
Quem precisa de ajuda pode procurar:
Centro de Atenção Psicossocial (CAPs)
Postos de saúde
Centro de Valorização da Vida (CVV) – fone: 188
Site: https://www.podefalar.org.br/
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