“Nas reuniões, a pessoa que busca ajuda é a mais importante do mundo”, expõe o voluntário. Grupo de AA completa 45 anos na cidade.
Quando ninguém mais respeita a pessoa que chegou ao fundo do poço por causa do uso abusivo de álcool, ela é abraçada, acolhida e considerada a mais importante do mundo pelos voluntários dos grupos de Alcoólicos Anônimos (AA) em Foz do Iguaçu. Para isso, é necessário dar o primeiro passo: procurar ajuda. O alcoolismo é declarado como doença pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
Assista à entrevista:
Essa história é bem conhecida por Nivaldo, que não terá o sobrenome divulgado na matéria. Ele chegou a beber um litro e meio de cachaça por dia e viu seu peso reduzir para 48 quilos. Hoje, estende a mão para ajudar quem quer vencer a doença do alcoolismo, como conta em entrevista ao programa Marco Zero, do H2FOZ e Rádio Clube FM.
O Marco Zero é um programa conjunto produzido pelo H2FOZ e Rádio Clube FM. Entrevista, opinião, enquete, entretenimento, esporte, cultura e agenda. Todo sábado, das 10h às 12h. Participe do grupo no Whatsapp para receber as novidades. https://bit.ly/3ws5NT0
Pesquisas indicam que houve aumento do alcoolismo durante a pandemia. Em Curitiba (PR), por exemplo, esse crescimento foi de 40%. “Não trabalhamos com estatísticas, mas houve aumento considerável de pessoas buscando ajuda nas reuniões e no nosso telefone de ajuda, inclusive de mulheres e jovens”, revela Nivaldo.
A pandemia é um período de incerteza e reclusão, afirma o voluntário. Nas reuniões de AA, o objetivo é acolher as pessoas e dividir experiências de vida pela palavra. “Nosso objetivo primordial é manter-se sóbrio e ajudar outras pessoas a alcançarem a sobriedade. O trabalho é todo no anonimato, sem precisão de dar o próprio nome caso a pessoa prefira”, explica.
Reuniões funcionam basicamente com depoimentos. “Baseiam-se na honestidade individual, em que a pessoa precisa aceitar sua situação de alcoólatra, admitir que já perdeu o controle sobre a bebida”, detalha Nivaldo. “Ela relata o que aconteceu, como era antes e como está agora.”
“Por mais baixo que seja o nível em que ela tenha chegado, para nós ela é a pessoa mais importante do mundo. Nos abraçamos e vamos juntos”
Um dos grandes problemas do alcoolismo, enfatiza o voluntário do AA em Foz do Iguaçu, é que a pessoa se sente isolada. “Ninguém quer ouvir um bêbado. No AA, a gente ouve todas as pessoas. Por mais baixo que seja o nível em que ela tenha chegado, para nós ela é a pessoa mais importante do mundo. Nos abraçamos e vamos juntos”, narra.
Própria trajetória
“Bebi durante 30 anos. Achava que estava controlando a situação. Dizia bebo quando quero, paro quando quero”, relata Nivaldo, frisando que essas são situações comuns elencadas pelas pessoas que buscam ajuda no AA. “Quando fui tentar parar por minha conta, não consegui, e aí bateu o desespero”, conta.
Quando o alcoólatra entende que está dominado pela bebida, começa a preocupar-se e a única solução que vê é na própria bebida. “Vira aquele círculo. Só quando a pessoa bebe passa a agonia, vem a ressaca e o processo volta tudo de novo, tendo que beber novamente”, salienta Nivaldo.
“A gente se sente acolhido e apoiado, é um sentimento que as pessoas demonstram de coração.”
“Quando cheguei ao AA, tomando um litro e meio de cachaça por dia, pesando 48 quilos – hoje tem cerca de 70 quilos –, as pessoas disseram na reunião que eu era a pessoa mais importante, quando ninguém mais acreditava em mim”, rememora. “A gente se sente acolhido e apoiado, é um sentimento que as pessoas demonstram de coração, não é da boca para fora. A gente participa do sofrimento um do outro”, frisa.
Sinais de alcoolismo
Como saber se é alcoólatra? Essa é grande pergunta feita pelas pessoas, diz Nivaldo. “Uma das características principais é quando alguém está se preocupando com a sua maneira de beber, quando dizem que você está bebendo demais e é preciso dar uma maneirada”, exemplifica.
Perder trabalho por causa de bebedeira e sentir que o consumo de álcool está interferindo nas relações familiares em casa e com amigos também são sinais. “Se a pessoa sente que não bebe mais por prazer, mas por necessidade. Se tem que beber todo o dia, levanta de manhã pensando em beber, também são alertas”, completa.
Rede de apoio
Em Foz do Iguaçu são cinco grupos de Alcoólicos Anônimos espalhados pela cidade, com três funcionando neste momento, devido à pandemia. Qualquer pessoa pode buscar apoio dos voluntários e participar das reuniões que são à noite. Os relatos compartilhados abrangem perda de família, de trabalho, adoecimento, vida nas ruas e até crimes por causa da bebida. Tudo anonimamente.
“É irmandade de homens e mulheres para ajudar outras pessoas a se recuperar. É um grupo autossuficiente, sem patrocínios de empresas ou governos e sem religião”, explica Nivaldo. Os recursos para aluguel, água e luz são arcados com doações dos próprios participantes. “É o alcoólatra pagando a sua própria conta”, acentua.
A rede de Alcoólicos Anônimos, relembra Nivaldo, surgiu nos Estados Unidos em 1935, a partir do diálogo e percepção entre um corretor e um médico, que bebiam. No Brasil, foi criada em 1947 e, em 1968, chegou ao Paraná. Os primeiros registros de AA em Foz do Iguaçu datam de 1976, há 45 anos, conta o voluntário.
“Dois bêbados, nos Estados Unidos, conversaram por quatro ou cinco horas sobre a bebida e sobre suas situações pessoais. Perceberam que enquanto conversavam não bebiam”, descreve Nivaldo. “Daí surgiu a ideia de continuar a conversa para não beber. E essa conversa está sendo continuada até hoje, por nós, voluntários dos Alcoólicos Anônimos”, conclui.
Em Foz do Iguaçu, o telefone para a busca de ajuda com os Alcoólicos Anônimos é (45) 99977-8205.
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