Venezuelanos lutam para sobreviver no Brasil

Eles ocupam empregos que muitos brasileiros desprezam e se organizam em associação para garantir direitos

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Eles ocupam empregos que muitos brasileiros desprezam e se organizam em associação para garantir direitos

Jésus Delgado tem 51 anos, é casado e pai de dois filhos. A história de vida dele poderia ser parecida com qualquer outra, mas o roteiro traçado pelo destino foi diferente. Há cinco anos, Jésus foi obrigado a deixar a Venezuela, onde vivia com a família, para recomeçar a vida no Paraguai. Por fim, acabou em Foz do Iguaçu.

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Militar aposentado, ele faz parte de uma legião de venezuelanos que vem deixando o país nos últimos anos para fugir da fome, perseguição e falta de oportunidades. Muitos deles cruzam a fronteira com países sul-americanos vizinhos para tentar dar novo sentido à vida e chegam ao Brasil.

Em Foz do Iguaçu e região, os venezuelanos já são tantos que formam uma pequena comunidade. Muitos deles, mais de 300, são membros da Associação de Venezuelanos de Foz do Iguaçu, presidida por Jésus. Há associados vivendo em Foz, Medianeira, São Miguel do Iguaçu e Cascavel. Estima-se que haja pelo menos outros 300 venezuelanos na cidade que não estão ligados à associação.

Boa parte dos migrantes é de advogados, médicos, contadores, professores, mecânicos e engenheiros de petróleo. Hoje eles trabalham em hotéis, supermercados, construção civil, linha de produção de cooperativas de abate na região ou como motoristas de aplicativos. Muitos dos postos de trabalho são desprezados por brasileiros em razão do baixo salário.

Profissionais qualificados às vezes são obrigados a omitir o currículo por temer não conseguir emprego. Médicos que não conseguem atuar no Brasil trabalham até em supermercados. Alguns que não têm trabalho percorrem as ruas da cidade para tentar juntar dinheiro e ir a outro país. Uma parcela mínima conseguiu comprar casa própria e pensa em se naturalizar brasileira.

Por meio da associação, os venezuelanos conseguem organizar-se, apoiar uns os outros e garantir alguns direitos para permanecer no Brasil.

Muitos saem da Venezuela para que não aconteça o pior

Jésus, que hoje trabalha em um hotel no centro de Foz, teve de sair da Venezuela por temer pela própria segurança física. “Começaram a matar e sequestrar famílias de militares”, conta. A condição de militar, diz, estava associada a pessoas que tinham comida e dinheiro, por isso ficavam visadas.

Presidente da Associação, Jésus Delgado dá apoio a quem chega em Foz

O que tirou Jésus da Venezuela foi um emprego que ele conseguiu no Paraguai. Saiu sozinho, deixando a esposa e os filhos para trás. A ideia seria buscá-los assim que possível. Ele começou a trabalhar e, em 2018, emprestou dinheiro do patrão para comprar passagens e trazer a esposa e os dois filhos para o Brasil.

Para a esposa, a saída do país foi um alívio. Um dos filhos do casal tem problemas respiratórios, e quando a doença se manifesta é preciso usar antibiótico. No entanto, com a situação difícil na Venezuela, a família não conseguia mais acesso ao remédio. “Uma vez trocamos uma pasta de dente pelo remédio”, revela a esposa de Jésus, Marlys Rivas, 44 anos.

O trabalho no hotel é o quinto emprego dele desde que saiu da Venezuela. Antes, a exemplo de boa parte dos venezuelanos, ele trabalhou nas cooperativas de abate. Durante a pandemia, a linha de produção nessas empresas foi a salvação para os seus conterrâneos, em turnos estimados de 12 horas entre a saída e a chegada em casa.   

Frustrações

O fluxo de venezuelanos começou a aumentar no Brasil em 2019 com a crise política na Venezuela. A maioria tinha intenção de viver em um país de língua espanhola, mas o Brasil acabou sendo uma melhor opção porque a Argentina foi afetada pela crise econômica e só permite a entrada de crianças que tenham documento com fotos.

Por serem obrigados a deixar o país, muitos venezuelanos acabam frustrados em outros países porque não podem exercer a própria profissão. Por isso, a associação reivindica atendimento psicológico aos imigrantes. Há professores doutores com mais de 55 anos que não conseguem trabalhar na área de atuação porque é preciso, muitas vezes, mudar de cidade para revalidar diplomas.

Alguns professores são do ensino básico; e outros, universitários. Uma das opções é fazer cursos profissionalizantes oferecidos pelo Senac para se inserirem no mercado de trabalho local.

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1 comentário
  1. Desde 2019, mais de 28 mil refugiados e migrantes foram atendidos em Foz

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