Aporofobia

O servidor Waldson de Almeida Dias reflete sobre Aporofobia.

Waldson de Almeida Dias | OPINIÃO

População de moradores de rua cresce significativamente na cidade das águas, Foz do Iguaçu.  

Em março de 2020, no começo da pandemia de corona vírus escrevi uma crônica que intitulei de “Os Invisíveis”, nela relato o que tinha visto através de viagens minhas o quanto as ruas das grandes cidades brasileiras estavam repletas de moradores de rua.  

Escrevi que a população de rua somente na maior cidade da América Latina, São Paulo, havia aumentado em 53% em 4 anos (2015 – 2019). A pandemia chegou ceifando vidas e mostrando a desigualdade existente no planeta terra. No final do ano de 2022, segundo dados do Ipea – Instituto Econômico de Pesquisa Aplicada, o número de moradores de rua no Brasil era de 281.472, um crescimento de 211% em dez anos. 

Viajei recentemente a cidade de Buenos Aires e lá também observei um aumento significativo de moradores de rua e pedintes nas ruas e avenidas da grande metrópole. Esse fato não é mérito apenas de Foz do Iguaçu, mas de um mundo capitalista em que o lobo de Cashmere, um único ser humano, homem branco possui uma fortuna nada modesta de 1,182 trilhão de real. “…oh! mundo tão desigual, tudo é tão desigual ôôô! Oh! De um lado esse carnaval, de outro a fome total ôôô! 

A canção de Gilberto Gil, embora se chame “A Novidade”, não traz novidade alguma nos dias de hoje em que os invisíveis se tornam a cada dia mais visíveis. 

Na semana em que passou escutei a palavra Aporofobia ser pronunciada em um debate sobre a população de rua na Câmara de Vereadores de nossa província. Aporofobia é uma palavra que foi criada pela filósofa espanhola Adela Cortina que advém da origem grega, á-poros (pobres) e fobos (medo) e tem o objetivo de retratar uma patologia, ou seja, uma doença, nesse caso uma doença social e que significa “rejeição ou aversão aos pobres”. 

Aporofobia foi eleita a palavra do ano de 2017 pela Fundaciõn del Español Urgente (Fundéu BBVA), significando a urgência do uso da referida palavra e da urgência de sua disseminação e entendimento. Eis uma palavra que aponta culpados, mostra ignorâncias, destaca racismos, condena pessoas a fome, a sede e a morte degradante e cruel. 

Para que essa palavra fosse usada com grande ênfase, minutos antes tivesse o pronunciamento contra aqueles que vivem nas ruas e o quanto eles estão a prejudicar o bom andamento dos cidadãos de bem de nossa cidade no seu direito de ir e vir pelas calçadas, praças e ruas de nossa amada província. 

Essa aversão aos invisíveis visíveis que habitam cada vez mais a nossa retina e podem ser sentidos por nossas narinas é um fato e contra fatos não existem argumentos. Mas, em momento algum fazemos uma pausa para pensar no dano que este mundo capitalista está efetuando nos seres que um dia foram humanos e hoje disputam com os cães lixos de nossas cidades.  

O Padre Júlio Lancellotti, religioso Paulista, da Pastoral do Povo de rua da maior cidade brasileira tem popularizado essa palavra: Aporofobia! O referido padre empresta seu nome a um Projeto de Lei que tramitou no Congresso Nacional, foi aprovado e na sequencia vetado pelo Presidente anterior e posteriormente esse Veto foi derrubado pelo mesmo Congresso que o sancionou. O projeto proíbe construções que visem afastar pessoas dos espaços públicos ou dificultar o acesso de idosos, crianças ou pessoas em situação de rua de ocuparem esses espaços, assim chamada de “Arquitetura Hostil”.  

O famoso dramaturgo inglês, William Shakespeare, disse certa feita que “só os mendigos conseguiam contar as suas riquezas”; quem sou eu para me opor as palavras de Shakespeare, bem eu sou Waldson de Almeida Dias e assino essa crônica e digo, tal qual escrevi em março de 2020 que não existe riqueza nem beleza que possa ser contada por quem é invisível e vive à margem da sociedade, sem ter uma cama confortável e um teto para se proteger. Eis o lugar onde habita a riqueza que pode ser contada, na magia da inclusão social, em que o invisível possa se tornar visível e isso não se trata de milagre, apenas de humanidade! 

Em tempo, que caiam as máscaras dos aporofóbicos de plantão. 

Waldson de Almeida Dias é servidor público municipal em Foz do Iguaçu.
Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a opinião do H2FOZ.

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