Para o autor da proposta, o livro cristão não é só religioso, mas “científico, cultural e histórico”; proposição não inclui elementos sagrados das demais crenças.
O vereador Jairo Cardoso (DEM) apresentou projeto de lei em que autoriza a prefeitura a firmar parceria para distribuição de Bíblias nas escolas públicas da rede municipal de Foz do Iguaçu. Segundo a proposta, a ênfase será nos “conhecimentos ético, moral, cívico, geográfico, científico e de fatos históricos de grande relevância”.
O texto do projeto não especifica com quem seriam estabelecidas as parcerias. Na justificativa do PL, o autor afirma que não haverá custo aos cofres públicos, pois as publicações seriam doadas por entidades, e à gestão municipal caberia a distribuição. Essa afirmação não consta do corpo dos dois únicos artigos da matéria em trâmite na Câmara – sendo que o segundo apenas informa a data em que passaria a vigorar a normativa.
Se aprovado o Projeto de Lei (PL) nº 141, pais, mães e responsáveis deverão autorizar seus “filhos ou tutelados” a receber exemplar da Bíblia. Justifica o edil que o livro é para muitos um instrumento religioso, porém, no seu entender, trata-se de um “conteúdo universal, científico, antropológico, arqueológico, cultural, geográfico e histórico”.
Prossegue Jairo Cardoso, para defender sua proposição, que a abrangência da Bíblia é “fantástica” e que a ciência a vê como “fonte de conhecimentos históricos muito importantes. Sua autoridade histórica também é inquestionável, já que vários países nasceram inspirados por suas páginas, como os EUA”, relata o vereador iguaçuense no texto.
Para ele, não há inconstitucionalidade na matéria porque, em sua visão, paradoxalmente, o projeto não incentivará a religião se for aprovado, nem obrigará o estudante a receber o livro, concluindo com isso que a proposta obedeceria ao fato de que o Estado brasileiro é laico. O PL do vereador Jairo Cardoso é específico à distribuição de Bíblias, não incluindo a oferta de demais materiais considerados sagrados para as outras religiões e crenças.
Ao proclamar o Estado secular, o texto da Constituição federal de 1988 sugere a separação entre as ações governamentais e os princípios religiosos. Em um sistema democrático, a laicidade prevê o equilíbrio do Estado a fim de resguardar a pluralidade e, principalmente, a neutralidade religiosa nas iniciativas públicas e pautas que impactam nos direitos individuais e da sociedade, seguindo o imperativo constitucional pelo qual “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”.
A Lei Orgânica de Foz do Iguaçu veda ao município “estabelecer cultos religiosos ou igrejas” e “manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança”. Nesse segundo caso, a ressalva pode ocorrer, obedecida à lei, quando houver interesse público, o que se entende contemplar a integralidade da população iguaçuense.
Trâmite
No último despacho, feito em 23 de setembro, o projeto do vereador Jairo Cardoso que autoriza a distribuição de Bíblias foi liberado para inclusão em pauta. Seu status atual diz que a matéria aguarda leitura no expediente, para posterior discussão do conteúdo na Casa de Leis.
Fé na tribuna
Na legislatura passada, o ex-vereador João Miranda propôs projeto que “consagra o Município de Foz do Iguaçu a Nossa Senhora, nos moldes da tradição cultural”. O objetivo era autorizar a exposição de símbolos dessa consagração, como imagens e monumentos, em prédios públicos e áreas urbanas da cidade.
Os vereadores da gestão anterior também causaram polêmica pela forma com que passaram a utilizar o dispositivo do regimento interno que prevê, antes de cada sessão ordinária, um momento para reflexão. Ocorre que, na prática, esse período na tribuna foi usado pelos edis para mensagens religiosas, de acordo com a crença de cada parlamentar.
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