H2FOZ – Paulo Bogler. Fotos: Marcos Labanca
Sábado, 30 de maio. Foz do Iguaçu confirmava 127 casos de covid-19. Nessa data, entravam em vigor as novas regras da prefeitura para o funcionamento do transporte coletivo. Entre elas, restrição do horário de operação até 22h, ônibus só nos horários de pico aos domingos e feriados e aumento da lotação para até 50% da capacidade dos veículos.
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A partir dessa normativa, as empresas passaram a conduzir passageiros em pé – até então, eram permitidos somente usuários sentados. O Decreto nº 28.159 foi o terceiro durante a pandemia, entre março e maio, com decisões sobre o sistema público de transporte e oferta de ônibus para a população.
Já vigorava a tabela de domingo. Com menos ônibus em circulação, passageiros devem destinar mais tempo para o deslocamento. Trabalhadores necessitam chegar com antecedência a seus empregos para não perder o horário. Maior tempo nos pontos de ônibus significa exposição a assaltos em algumas regiões da cidade.
Some-se, ainda, que não é aceito o pagamento da tarifa com dinheiro, apenas com o Cartão Único. E, devido à abertura do Terminal de Transporte Urbano (TTU), quem pega duas conduções nem sempre consegue fazer a integração do sistema nos 90 minutos permitidos, pela redução da frota, obrigando-se a pagar segunda passagem.
A restrição das linhas do transporte público em Foz contribui para a aglomeração de pessoas no TTU e nos pontos de acesso; dentro dos ônibus, compromete o distanciamento entre as pessoas recomendado pelas autoridades sanitárias. Ocorrem lotações acima do permitido nas linhas de maior movimento, itinerários de regiões populares.
O transporte público coletivo é a segunda atividade de maior disseminação do novo coronavírus no município, conforme o superintendente do Instituto de Transportes e Trânsito (Foztrans), Fernando Maraninchi. “O segundo local de maior risco é dentro do transporte coletivo”, declarou nesse sábado, 20, em entrevista ao programa Marco Zero, produção do H2FOZ e Rádio Clube FM (assista aqui).
Conforme o Foztrans, hoje circulam somente 45 ônibus, e outros 12 extras nos horários de pico. Isso se deve, segundo a autarquia, à liminar obtida pelas concessionárias do transporte público iguaçuenses, concedida pelo Tribunal de Justiça do Paraná. Essa decisão é para “manter o equilíbrio financeiro” das empresas, que alegam transportar menos passageiros.
Trabalhador paga a conta
Auxiliar administrativa no Hospital Municipal Padre Germano Lauck, Luzinete Coelho mora no Jardim Ipê III. Para chegar ao trabalho, embarca às 6h40 e chega ao serviço perto da 7h. Seu turno de trabalho começa às 8h. A volta é igualmente difícil, já que uma das frequências de ônibus retiradas do horário é a que ela utilizava.
“Para ir embora, como meu ônibus agora demora a passar, vou até o terminal para evitar pegá-lo cheio. Volto todo esse trajeto entre a Avenida Paraná e o centro”, relata. “Os ônibus continuam muito lotados, porque os motoristas sabem que se não embarcarem o passageiro ele terá que esperar por mais uma hora”, conta.
Ela afirma que esperar muito tempo o ônibus e chegar adiantada ao trabalho faz aumentar o estresse. “Trabalho em um hospital, onde tem toda essa carga por conta da pandemia, embora temos as medidas de proteção. Cansada, ainda tenho que enfrentar uma verdadeira maratona no transporte público”, frisa Luzinete.
Gasto com transporte por app
Em um ponto de ônibus da Avenida Paraná, a reportagem acompanhou por meia hora a comerciária Thaís dos Santos em sua espera pela condução, no fim da tarde de sexta-feira, 19. Moradora da Vila Miranda, na região de Três Lagoas, ela saiu mais cedo do trabalho, em um supermercado na entrada de Foz, para resolver demandas pessoais.
Quando seu ônibus passou, não parou no ponto porque tinha muitos passageiros em pé. Ela precisou utilizar transporte por aplicativo, ao custo de R$ 15 a corrida. “O pior é no trabalho, pois cortaram muitos horários. Como sou do ‘fecha’ [encerramento do expediente], e os ônibus só passam até as dez da noite, a empresa precisou contratar transporte particular”, narra.
Com a redução das linhas, muitos ônibus saem lotados do bairro, fazendo-a perder o transporte. “Vivo perdendo o horário e chegando atrasada ao trabalho. E nos domingos e feriados? Não passa o meu ônibus, sou obrigada a pegar mototáxi ou Uber”, revela. “No trabalho, as colegas que ficam à noite no ponto são assaltadas sempre”, expõe Thaís.
Jornada estendida
A equipe do H2FOZ testemunhou a longa espera da doméstica Evanilde Soares de Almeida no TTU pelo ônibus da linha São Roque. Ele mora na Vila C e trabalha em uma residência no Jardim Iguaçu, na região da Avenida Felipe Wandscheer. Com o corte dos horários, ela é obrigada a aguardar cerca de 40 minutos todos os dias no terminal, até sua condução ao emprego.
“Essas mudanças, com o horário de domingo, dificultaram muito para nós, que dependemos de ônibus para trabalhar”, enfatiza. “Liberaram tudo para reabrir, aumentando a população que precisa de transporte coletivo, mas retiraram as linhas. Prejudicou muito, pois perdemos muito tempo esperando”, avalia.
Para voltar do trabalho e evitar passar pelo centro e nova espera no TTU, Evanilde utiliza a linha Interbairros, embarcando no Jardim Iguaçu. Ela diz que o transporte passa perto das 17h e a deixa no bairro em que mora às 18h55. “Gasto quase duas horas no ônibus para voltar para casa, depois de um dia inteiro de trabalho”, acentua.
Profissional do setor de limpeza no aeroporto, Daniel de Andrade também reclama do tempo despendido no deslocamento casa-trabalho-casa. Ele é mais um que não escapa de ter de pagar transporte privado quando perde o ônibus ou aos domingos e feriados, dias em que só passa condução nos horários de pico, entre 6h e 8h, 11h e 14h, e 16h e 20h.
“O transporte coletivo de Foz do Iguaçu está muito ruim. Tenho que sair de casa duas horas antes de entrar no trabalho, e a volta é a mesma coisa. Precisamos de mais linhas, mais ônibus”, reivindica. “Já tive de pagar R$ 20 de transporte em um fim de semana que não tinha mais ônibus. Isso pesa no bolso. Vai somar no final do mês para ver”, contabiliza o morador da Vila C.
Terminal
A reportagem esteve no TTU em dois dias, em horários diferentes. Entre as medidas de prevenção no local foram encontrados dipensers de álcool em gel, tapetes de sanitização e sinalização do distanciamento entre as pessoas no piso. Os tapetes, entretanto, estavam todos secos, indicando não conter os produtos sanitários necessários.
Em toda a extensão do Terminal de Transporte Urbano, não foi localizado nenhum informativo impresso nos murais e outros espaços com orientações ou informações sobre a covid-19. Nem mesmo os contatos da central municipal para o atendimento em relação à doença estão disponíveis para quem passa pelo espaço.
Para o embarque em algumas linhas é mantida a distância mínima. Em outras, há aglomeração e contato entre as pessoas. O H2FOZ não localizou nenhum fiscal ou orientador exercendo atividade educativa ou mesmo de controle para evitar a proximidade entre os passageiros. Não foi avistado nenhum usuário do transporte público sem máscara de proteção no terminal.
Outro lado
O Foztrans ressalta que está ciente da necessidade de aumentar o número de ônibus em circulação e que a gestão do transporte público é um desafio para administrações de várias partes do país. Afirma que decisão da Justiça a favor do Consórcio Sorriso estabelece a restrição do número de veículos em circulação, já que há menos passageiros, o que reflete na planilha financeira das empresas.
A autarquia informou, em nota, que a prefeitura reverteu, no âmbito jurídico, “subsídio financeiro emergencial” para as empresas operadoras do Consórcio Sorriso. “O repasse de subsídio foi suspenso pelo Superior Tribunal de Justiça, entretanto persistem as demais restrições”, diz o instituto.
Sobre as medidas protetivas à covid-19 no terminal de ônibus, o superintendente do Foztrans, Fernando Maraninchi, enumerou as iniciativas adotadas em entrevista à Rádio Clube FM. “Quem comparecer ao TTU percebe que foram disponibilizados diversos dispensers e tapetes sanitizantes com água sanitária”, aponta.
“Fizemos convênio com a Unila, que utilizam um quiosque no local para fazer trabalho de saúde”, prossegue Fernando. “Em todas as paradas foram pintadas faixas amarelas com o distanciamento aos quais as pessoas precisam se atentar, e fizemos compra de gradis para ajudar na organização das filas”, completa.
Em relação à integração do transporte, com o terminal “aberto”, o Foztrans declarou que “a integração temporal pode ser realizada através de qualquer ponto de ônibus, e não necessariamente via TTU”.
Clique para ler na íntegra a nota do Foztrans
TRANSPORTE COLETIVO – REPORTAGEM ESPECIAL
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