Não é sobre eleição, mas sobre etarismo

A superexposição de figuras públicas, que envelhecem sob os holofotes, costuma ser criticada, como algo evitável.

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Aida Franco de Lima – OPINIÃO

A campanha presidencial americana está sendo transmitida por alguns veículos brasileiros em tempo real, e neste último final de semana o atual presidente Biden comunicou oficialmente sua desistência. Uma série de fatores culminou nessa decisão, que estava sendo aguardada. E a idade de Biden foi, aparentemente, o infiel da balança. O atual presidente, e agora ex-candidato à reeleição, tem 81 anos, nascido em 20 de novembro de 1942. Trump, ex-presidente e candidato a presidente, tem 78 anos, nascido em 14 de junho de 1946.


O peso do etarismo, a discriminação social pela idade, o olhar de deboche e chacota da sociedade em relação ao outro estão bastante revelados nessa campanha. Pela mesma sociedade que cobra respeito aos mais velhos, que busca pela fonte da juventude, que vende produtos que prometem combater o envelhecimento. A mesma sociedade que vende cirurgias milagrosas que prometem o corpo perfeito.


Tudo que está em jogo, os riscos e consequências de eleger um candidato que assumidamente não respeita as próprias leis de seu país e é um negacionista climático, em detrimento de qualquer outro que tenha pensamentos menos negacionistas, seja Biden ou quem for, parecem ter ficado resumidos à idade.
Com a desistência de Biden, Trump agora é o candidato mais velho na história dos EUA à presidência.

Talvez Trump sinta na pele o que tem semeado ao longo do tempo, junto a seus seguidores. No dia seguinte à desistência de Biden, debochou dizendo que o democrata não lembrava que não era mais candidato: “É um novo dia, e Joe Biden não se lembra de ter desistido da corrida ontem! Ele está exigindo o seu calendário de campanha e organizando negociações com os presidentes Xi, da China, e Putin, da Rússia, sobre o possível início da 3.ª Guerra Mundial”, escreveu na rede social X.


É bastante delicado falar em respeito pela idade em uma sociedade que busca freneticamente a pele esticada. E isso tudo alavancado pela mídia, que em um momento pede respeito e em outro faz piada com o tema.

Kamala Harris, 59 anos, agora se quiser jogar como Trump pode fazer piada com sua idade. Ele é a bola da vez. Mas as coisas não são bem assim, parece que nas campanhas políticas vale tudo mesmo, já começaram inclusive os ataques racistas e misóginos a quem deve mesmo concorrer com Trump.
Economia, imigração, aborto e meio ambiente são temas que deveriam ser mais importantes que as questões de idade. Até porque de nada adianta um candidato ser muito jovem se ele tiver ideias retrógradas. E não é preciso lembrar que idade é sinônimo, necessariamente, de longevidade. Trump escapou por um triz, não foi?


Até antes da desistência de Biden, a discussão era sobre suas gafes. Será que agora a idade de Trump será explorada?

As pessoas se esquecem de que a idade, como diz o jargão popular, chega para todos. Ocorre que muita gente prefere viver no mundo da ficção. Como quem se refere à jovialidade eterna de Marilyn Monroe, que hoje estaria com 98 anos, e vai para as redes sociais e debocha da “feiura” de Brigitte Bardot, atualmente com 89 anos. A diferença é que a primeira morreu ainda muito bela, aos 36 anos, e a segunda envelhece diante da mídia.


Biden jogou a toalha, e jogou até tarde demais. Nem deveria ter se metido a enfrentar mais uma campanha e virar alvo de chacota mundial. Não sabemos qual é o nível de acesso de uma figura como ele às críticas e comentários na imprensa e redes sociais, mas deve ser melancólico alguém envelhecer com o peso do julgamento alheio. Aos 81 anos, pode viver muito mais tempo que os que o criticam e debocham de sua senilidade.

Com 81 anos, ninguém deveria virar piada por lapsos de esquecimento, voz baixa ou caminhar lento. Mas ainda não estamos preparados para esse papo. Contudo, nesse aspecto, a sociedade consegue permanecer terrivelmente imatura para esta conversa. Infelizmente.

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