Empresa não é sua família

Vida não deveria ser sinônimo de trabalho.

Eu não sei em que época começou a moda de as empresas mudarem as terminologias para tratar os empregados como colaboradores e dizer que são grandes famílias. E muita gente acreditou. Empresa não é família, que teoricamente aceita a pessoa como ela é. Empresa compra o seu tempo e, quando não vê mais utilidade, substitui você. Simples assim.

Neste final de ano, algumas notícias ganharam espaço. Como jornalistas e gestores de grandes grupos de comunicação que depois de décadas dedicadas às suas empresas receberam como “presente” do “bom velhinho” a demissão. Alguns rostos muitos conhecidos dos telespectadores não tiveram nem tempo de cumprir o aviso prévio.

Mas isso aqui é nada, se comparado ao que ocorreu na cidade de Cláudio (MG). Durante a festa de confraternização, o empresário Kerli Fabrício, de 37 anos, informou ao empregado Eliandro Bastos, 36, que esse participaria da sua última festa na empresa, pois seria demitido. Sendo o funcionário mais antigo, tinha um custo alto para a firma.

Tudo errado, afinal momento de confraternização não é propício para tratar de demissão. Fim de festa, o álcool provavelmente falando mais alto. No final, uma briga, uma discussão e um assassinato. Nem Eliandro, nem Kerli terão mais festas na empresa. O funcionário matou o patrão. Duas famílias destruídas.

Muitas pessoas se esquecem de viver e transformam a vida unicamente em trabalho. E esperam reconhecimento que talvez nunca chegue. É bastante comum as pessoas entrarem em depressão quando se aposentam, porque não encontram outro sentido para ocupar o tempo agora livre. De outro modo, uma parte da sociedade espera por um tempo livre, uma aposentadoria, que nunca chega. E uma outra casta, como dos magistrados e militares, quando quebra as normas, é punida com a aposentadoria, ou melhor, reserva.

Mas voltando ao tema inicial, esta balela que inventaram de que a empresa é uma família é mais uma conversa de coaching para fazer de conta que o funcionário é insubstituível e imprescindível, por isso tem de dar o seu melhor.

Para ajudar, incentivam os funcionários a não participarem de sindicatos, para que não tenham poder de negociação e também, de preferência, aceitem as regras do mercado, que se conformem com a redução de seus direitos, seja contra a diminuição de jornada de trabalho, alardeando o fantasma do desemprego.

Já ouviu a frase que negócios e família não combinam? Se os entes consanguíneos nem sempre se bicam, não é com empregados que será diferente. Família de verdade apenas aceita quem você é. Briga, discute, mas na hora que mais precisam estão unidos. Salvo raríssimas exceções, a empresa quer seu resultado – e, quando você não é mais útil, a porta da rua é a serventia da empresa.

Lembra quando os supermercados passaram a abrir aos finais de semana? Disseram que isso aumentaria os postos de trabalho. Outra balela. De vez em quando, vou ao mercado perto de casa no domingo, por volta do horário do almoço. Estão lá alguns caixas, cansados, com olhar desacorçoado. Enquanto passam as comidas e temperos da macarronada das famílias dos outros, as suas estão com um lugar à mesa vazio.

Um novo ano está chegando. Quando estiver no seu trabalho, faça o seu melhor. Mas lembre: a vida passa muito rapidamente para você entregar sua vida a terceiros. Há vida além do trabalho! Afinal, ninguém sabe quem receberá do Papai Noel a cartinha de demissão.

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