A sociedade do barulho

O barulho excessivo impacta diretamente na qualidade de vida, em cenário que conquista à primeira vista.

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Aida Franco de Lima – OPINIÃO


Você se incomoda com qual tipo de barulho? Fiz essa pergunta em sala de aula. As respostas foram as mais diversas possíveis. Desde o barulho de pessoa mastigando comida com boca aberta ao som estridente de uma motocicleta sem escapamento.

Não é frescura. Não é chatice. É realmente um problema com o qual as pessoas com audição mais sensível realmente sofrem. E parece que quanto mais tentamos fugir do ruído, mais ele nos persegue.


Tive uma experiência pessoal, que não desejo a ninguém. Por um breve período, morei em um condomínio maravilhoso, no sexto andar, com visão para um lago, área de lazer e mata. Era um sonho acordar e ver aquela neblina. E um chafariz no meio do lago, com o qual eu acordava no meio da noite, imaginando estar chovendo.


Mas tudo virou um grande pesadelo, e penso que foi depois que o chafariz deixou de funcionar. Foi então que todo o barulho que estava “escondido” por ele veio à tona. Parecia algo surreal. O ruído da obra da construção ao lado, de um novo bloco de condomínios em estágio avançado, incomodava, mas o pior ainda estava por vir.


Como disse, era o sexto andar, mas a acústica ruim do prédio fazia com que os sons dos vizinhos viessem de todos os lados. Era a moradora do sétimo andar andando de salto, antes de sair para o trabalho, e ela também arrastando móveis de madrugada. Para ajudar, ao lado, no 603, uma obra interminável. Era reforma dos pisos e azulejos, pancadas o dia todo.


Para completar a orquestra do barulho, do outro lado do condomínio, mais uma outra obra de prédio também, porém em estágio inicial, de fundação e derrubada da mata. Era aterrorizador. Sete horas da manhã, e escavadeira derrubando o morro. Triste demais, ainda mais para mim, que tento defender o meio ambiente a todo custo. Sim, denunciei ao setor ambiental, mas você acha que adiantou algo? A resposta é não.


Em um desses dias, eu – que lecionava de noite e, portanto, precisava das manhãs para dormir até mais tarde e depois preparar as aulas – apenas fechei as janelas para tentar impedir que o barulho da motosserra viesse para o apartamento. Não havia nada a ser feito. Por acaso, em dado momento, olhei para fora e percebi que a origem era outra. Tratava-se da equipe de manutenção da jardinagem, que em vez de tesouras, para aparar os pingos de ouro, utilizava uma máquina tão barulhenta que parecia uma motossera. E equipamento similar era usado para podar o gramado. Acho que a intenção era somente acordar os moradores mesmo, pois a grama estava muito baixa, e os pingos de ouro, com sua galhada esmirrada.


Não falei do barulho dos carros dos moradores, visitantes e entregadores, nem de alarmes disparados de madrugada, nada. Crianças e cachorros, isso a gente aceita e ponto. Isso já está dentro do pacote de normalidades. Mas morar em frente a uma área de lazer, de cara para a mata, ou o que sobrou dela, e não ficar janela com janela com o vizinho, tinha seu preço. O gosto musical, eclético, por assim dizer, obrigava a escutar os mais variados gêneros que, conforme aumentava a quantidade etílica, também os decibéis acompanhavam. E pior, os convidados cantando junto, talvez achando mesmo que tinham o timbre de Freddie Mercury.


E de repente, tudo que no começo parecia lindo e maravilhoso perdeu a graça. Contudo, o barulho que mais me incomodou foi o da retroescavadeira. Um dia comentaram no grupo do condomínio sobre o dano ambiental que estava ocorrendo. E os moradores, proprietários de apartamentos, correram dizer que era o preço do progresso, que a obra iria valorizar ainda mais a região e forçar o município a abrir vias de acesso que até então estavam separadas na região.


Toda essa situação me fez refletir sobre o desconforto das pessoas com sensibilidade a ruídos, dos animais que se assustam e fogem desesperados por conta de disparos de bombas, tiros, entre outros. Ainda me faz pensar nas pessoas sem noção, que desconhecem a tecnologia fone de ouvido, que dividem os sons de seus celulares com todo o entorno, seja de uma conversa privada ou um vídeo estúpido que veio na corrente do zap.


Existem ainda aqueles celulares estridentes, com notificações, as chamadas que as pessoas fazem ou atendem em qualquer lugar. De minha parte, resolvi o problema deixando-o no silencioso o tempo todo. E quando aumento o volume para escutar o despertador, deixo no modo avião, cancelando qualquer outro barulho que vá atrapalhar meu sono.


Há todo um aparato jurídico que tenta controlar o nível de ruído oriundo de inúmeras situações, seja do escapamento de carros ou do som alto de festas. Mas no mundo ideal essa regulamentação deveria vir do indivíduo.


Desde o aluno que chega atrasado à sala de aula, não consegue erguer a cadeira, arrasta-a e incomoda todos, ao vizinho que insiste em dividir seu gosto musical com resto dos moradores. Ou o motorista que fica irritado e deixa ainda mais estressados os demais com a buzina no meio do engarrafamento. O ideal seria que as pessoas buscassem equilíbrio, todavia isso é gerar muita expectativa. Talvez a saída seja mesmo o fone de ouvido, que cancela ruídos.

Este texto é de responsabilidade do autor/da autora e não reflete necessariamente a opinião do H2FOZ.

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