Ponte Tancredo Neves, 1985: problemas de ontem e de hoje

Três décadas atrás, queixas dos moradores da fronteira eram similares às atuais.

Guilherme Wojciechowski

A inauguração oficial da Ponte Tancredo Neves, em 29 de novembro de 1985, foi recebida com expectativa de progresso pelos moradores de Foz do Iguaçu (Brasil) e Puerto Iguazú (Argentina).

Até então, a ligação entre as duas cidades era feita de forma precária, por balsas que cruzavam o rio Iguaçu. Com a nova ponte, esperava-se não apenas a agilização da travessia, mas a facilitação da circulação de turistas e a intensificação do transporte de cargas, dinamizando a economia local.

Do lado brasileiro, obras estruturais importantes foram tiradas do papel, como a duplicação da Avenida das Cataratas, no trecho entre o Boicy e o atual Trevo da Argentina”; e a modernização da Avenida Costa e Silva, principal conexão com a BR-277.

O clamor pela construção da Ponte da Fraternidade” era antigo, como indica um trecho do documento entregue ao general João Baptista Figueiredo, por membros da Comissão Mista Pró-Construção da Ponte Brasil/Argentina, durante visita do então presidente à cidade de Foz do Iguaçu em 1979:

Todo o povo do Paraná e Misiones (Argentina) vem reivindicando com amor desmedido esta obra, principalmente agora que o turismo argentino descobriu as Cataratas do Iguaçu e nosso mercado brasileiro encontra as maiores dificuldades em atravessar o rio Iguaçu, pois o sistema de balsa é bastante antigo, perigoso e atrasado, além de caríssimo. (Nosso Tempo, 15 de janeiro de 1983, página 03)

A euforia pela inauguração, entretanto, durou menos de uma semana, como indica o relato abaixo, intitulado Agentes de viagem protestam contra burocracia na Ponte Tancredo Neves”, publicado pelo semanário Nosso Tempo, de Foz do Iguaçu, na capa de sua edição de 06 de dezembro de 1985:

A menos de oito dias da inauguração da Ponte Tancredo Neves, já começaram a surgir problemas de todo dia. Como se não bastassem os protestos generalizados dos balseiros e outros que prestavam serviços no Porto Meira, chegou a vez dos agentes de viagem e hoteleiros de Foz do Iguaçu. Ocorre que o Departamento de Rodagem da Argentina está exigindo um seguro especial de 400 dólares para cada ônibus ou micro que cruze a ponte. Este seguro tem que ser adquirido em território argentino e sendo renovado a cada quatro meses. Além disso o Ministério do Transporte implantou uma taxa de um austral [moeda argentina da época] para todos os veículos que cruzarem a ponte após as 19 horas e nos sábados e domingos. Segundo o delegado do Sindicato das Empresas de Turismo do Paraná – Sindetur, estas medidas estão dificultando o fluxo de turistas para o lado argentino. (Nosso Tempo, 06 de dezembro de 1985, página 01)

Ressalte-se que temas como exigências de seguros automotivos especiais e tentativas de cobranças de taxas migratórias continuam, até hoje, na pauta dos principais entraves fronteiriços.

Na ocasião, o Consulado da República Argentina em Foz do Iguaçu emitiu comunicado orientando os moradores de Foz do Iguaçu e região sobre as regras de admissão ao país e oferecendo a confecção de uma credencial” fronteiriça, como forma de diminuir a burocracia criada pelo próprio governo argentino:

A Administração de Aduanas de Puerto Iguazú, Misiones, através do Consulado da República Argentina em Foz do Iguaçu, informa que, para os residentes na área de até 50 quilômetros da Ponte Internacional Tancredo Neves e proprietários de carro ou táxi, criou-se um sistema que facilita a travessia na fronteira dos dois países, evitando o preenchimento de formulários em cada oportunidade. Para isso as autoridades aduaneiras argentinas criaram uma identidade a ser colocada no pára-brisa dos veículos, documento fácil de ser obtido, bastando apresentar atestado de residência expedido pela autoridade policial mediante apresentação de documento de propriedade do veículo e dados pessoais (nome, endereço e identidade) dos possíveis motoristas autorizados a dirigi-lo. O trâmite deve ser encaminhado no Centro de Fronteira Argentino, cabeceira da Ponte, em Puerto Iguazú, das 8 às 12 e das 17 às 19 horas, de segunda a sexta-feira. O tempo de permanência na Argentina com este documento é de 72 horas cada vez e para um raio de circulação de até 50 quilômetros da fronteira. A validade do documento é de 3 anos. (Nosso Tempo, 06 de dezembro de 1985, página 14)

Como se vê, os relatos dos problemas atuais e os de dezembro de 1985 podem não ser mera coincidência. Nos 30 anos da Ponte Tancredo Neves, brasileiros e argentinos parecem não ter aprendido, ainda, a dialogar na mesma língua.

* Guilherme Wojciechowski é radialista e apresenta, todos os sábados, o programa Front (das 10h às 12h) na Transamérica Foz 104,5 FM. Foi, anteriormente, diretor de jornalismo da rádio CBN e editor do blog Sopa Brasiguaia, dedicado às notícias da fronteira.
 

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