H2FOZ – Cláudio Dalla Benetta
Não é coisa pra amador, a não ser que seja um sortudo. Produzir bitcoin, a moeda virtual hoje aceita em diversas operações mundo afora (inclusive, claro, no submundo) exige um grande investimento, muito gasto de energia elétrica e envolve risco – o ativo flutua, e hoje até se fala em “bolha”. Além disso, muitos governos não são favoráveis a essa “moeda”.
Mesmo assim, em matéria de 2017, o jornal Gazeta do Povo informava que, no mundo, um milhão de grandes computadores funcionavam ininterruptamente (sim, eles não podem parar), produzindo 3,6 mil novas unidades de bitcoins todos os dias e consumindo 30 mil milhões de megawatts-hora (MWh) de energia elétrica, mais do que a Irlanda ou a Dinamarca.
Esse é o grande atrativo do Paraguai: sócio de duas binacionais, Itaipu e Yacyretá, o Paraguai tem direito a muita energia, mas ainda não utiliza. E, mesmo hoje, cobra bem menos pela eletricidade que outros países, como o Brasil. Foi o que atraiu brasileiros. É o que está atraindo chineses.
O portal especializado em criptomoedas Cointelegraph obteve informações exclusivas de que dois grandes grupos de mineração da China já estão em conversas com o governo do Paraguai para iniciar operações no país. Eles também estão negociando a compra de fazendas de mineração comandadas por brasileiros.
Em uma das tratativas a que o Cointelegraph teve acesso, os chineses negociam a compra de quatro galpões, com dois andares cada, e de uma fazenda de mineração estruturada com contêineres.
Os chineses estão preparados tanto para a compra total das operações como para fazer parcerias, em que os brasileiros ficariam com 25% do negócio, segundo o Cointelegrah. Mas o comando seria dos chineses.
DE OLHO DESDE 2018
Ainda de acordo com o Cointelegraph, os chineses estão de olho no Paraguai desde 2018, quando a gigante mundial de ASIC Bitmain encomendou um estudo sobre o mercado de mineração na América Latina. Ah, sim, ASIC, a máquina que a Bitmain produz, é um computador desenhado especificamente para a tarefa de mineração de criptomoedas.
Como enfrentava crises internas, a Bitmain cancelou os planos de abrir uma fazenda no Paraguai e fez parcerias para distribuir equipamentos na América Latina.
Mas, em 2019, conta o Cointelegrah, um grupo de chineses começou a sondar diversas fazendas de mineração no Paraguai, enquanto outros grupos procuraram o governo paraguaio e fecharam acordos para expansão e implantação de fazendas de Bitcoin no país, embora nenhuma esteja ainda em operação.
POR QUE O PARAGUAI?
O clima quente e seco do Paraguai é desfavorável à mineração de Bitcoin, que exige uma superestrutura de resfriamento. Mas aí entra um dos atrativos do país vizinho, a energia barata e a enorme oferta de terras planas.
O Cointelegraph descreve Hernandarias, onde as fazendas de mineração estão instaladas no Paraguai, como “praticamente um deserto com uma só estrada asfaltada e centenas de condomínios empresariais com pouquíssimas indústrias”, já que não vingou a proposta do governo de fazer da área o grande polo industrial do país.
Na China, que domina a mineração no mundo, um dos problemas é a energia instável; outro, o terreno montanhoso e muito sujeito a desastres naturais.
Portanto, para os chineses, o Paraguai oferece importantes atrativos, tais como terreno propício e energia barata, constante e de fontes renováveis, lembra o Cointelegraph. Além disso, apesar das alternâncias no poder, o Paraguai tem estabilidade no governo, que além disso tem clara intenção em impulsionar a instalação de fazendas de mineração no país.
O Paraguai já poderia ser um produtor maior de Bitcoin, mas a logística atrapalhou. O tempo entre encomendar e receber ASIC fabricados na China podia demorar até 12 meses. Mas os chineses que querem entrar no Paraguai já têm contato direto com as maiores fabricantes de ASIC para utilizar a mesma rota logística da importação de eletrônicos e outros produtos “made in China”.
ONDE É ACEITA OU NÃO
BITCOIN É O QUÊ?
Discute-se hoje se o Bitcoin é uma moeda, uma forma de dinheiro ou uma reserva de valor. Ainda não há uma conclusão. O que se sabe é que a criptmoeda veio para ficar, embora seu criador, o desconhecido Satoshi Nakamoto, tenha nomeado a invenção como um sistema de pagamento Peer-to-Peer (P2P) e não exatamente como uma moeda.
Para produzir a criptomoeda, são utilizados supercomputadores que equivalem a seis videogames de última geração cada um, que realizam cálculos matemáticos de alta complexidade em milésimos de segundos. Juntas, as máquinas estão ligadas a uma espécie de rede paralela na web. A cada dez minutos, o software da bitcoin lança uma equação matemática diferente na internet. O computador que desvendar primeiro a fórmula é recompensado com um lote de preciosos 12,5 bitcoins.
BRASILEIROS NO PARAGUAI
A reportagem de 2017 da Gazeta do Povo contava que o brasileiro Rocelo Lopes foi o primeiro a instalar uma fazenda de criptmoeda em Ciudad del Este. Na época, ele produzia 8,3 bitcoins por dia, o que lhe rendia, segundo ele, um faturamento bruto de R$ 14,5 milhões por mês.
Ele tinha seis mil máquinas em um espaço de 750 metros quadrados. As máquinas consumiam, por mês, 10 megawatts de energia, equivalente ao consumo de duas mil casas paraguaias – média calculada com base nos dados da Ande, a estatal responsável pela distribuição de eletricidade no país.
A reportagem da Gazeta ouviu também o carioca Thiago da Silva Rodrigues, que aos 28 anos era um dos novos ricos da Bitcoin. Ele estava no Paraguai havia seis meses produzindo a moeda virtual. “Eu era um cara de classe média, da Barra da Tijuca. Agora estou rico”, contou ao jornal.
No Paraguai, Rodrigues mora (morava?) no condomínio mais luxuoso da região, o Paraná Country Club, em Hernandarias, a 15 quilômetros de Ciudad del Este. É lá que residem hoje todos os brasileiros do bitcoin na região, além dos ricaços em geral, brasileiros, paraguaios e de outras nacionalidades.
O Paraná Country Club tem aeroporto para pequenos aviões, dois campos de golfe e estande para prática de tiro (o porte de armas é liberado no Paraguai). Fica às margens do Rio Paraná, com vista para a Ilha Acaray, que abriga a usina hidrelétrica de mesmo nome.
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