BID diz que eclusa em Itaipu seria cara e problemática

O estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento é de 2011, mas continua atual. A obra tem inconvenientes financeiros, ambientais e uso seria inferior ao previsto.

A construção da eclusa na usina de Itaipu, para permitir que embarcações pudessem ultrapassar a barragem, ainda vai render muita discussão.

O Paraguai quer incluir a obra em “novos conceitos econômicos” pós-revisão do Anexo C, em 2023. O Brasil não sinalizou com a aprovação.

Confira: Paraguai quer eclusa em Itaipu; mas quem vai pagar?

Em 2018, o assunto já estava na berlinda, já que era divulgado o estudo de consultores sobre a viabilidade da obra.

Naquele ano, este editor publicou, no site “Não Viu?”, um artigo intitulado “Eclusas em Itaipu: projeto não leva em conta custos e riscos ao ambiente e à produção”.

Vale a pena reproduzir, já que o assunto parece ter interessado a muita gente.

TEORIA E PRÁTICA

Na teoria, a construção de eclusas para permitir que embarcações transponham a barragem de Itaipu é uma ideia fantástica!

A navegação seria possível entre o Brasil, o Paraguai e a Argentina, a um custo de transporte inferior ao rodoviário ou até ferroviário.

Na prática, a história é bem outra. Em primeiro lugar, há a questão dos custos.

Um amplo estudo feito pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em 2011, concluiu que nem a alternativa de eclusas nem o de polos intermodais (a transposição da barragem seria feita por terra) seriam viáveis, devido aos custos elevados.

O estudo mostrou que, de fato, a alternativa de eclusas pela margem paraguaia, como prevê o recente estudo feito por duas empresas europeias, custeado pela Itaipu no Paraguai, seria o mais condizente para a transposição da usina.

A construção da eclusa custaria US$ 1,5 bilhão (R$ 7,6 bilhões), mais US$ 8,2 milhões ao ano (R$ 41,4 milhões) para operar a eclusa.

Fala-se em “eclusa”, no singular, mas, na verdade, a transposição de Itaipu exigiria quatro eclusas, como se vê no projeto.

VIÁVEL SÓ COM MENOR CUSTO

Já em 2011, o estudo do BID indicava que, se iniciada à época, a obra representaria um investimento superior a US$ 1,4 bilhão.

Ao fazer uma projeção do volume de cargas durante os anos seguintes à conclusão das eclusas, o BID concluiu que o custo precisaria ser 70% inferior ao estimado para que o empreendimento fosse viável.

E o BID achava que os gastos seriam bem maiores do que aqueles previstos.

“A estimativa de investimentos, em grande medida, já é conservadora, pois está balizada pelos investimentos em obras civis e não considera custos de projetos, por exemplo.”

MEIO AMBIENTE

É claro que uma obra desse porte teria uma série de inconvenientes ambientais.

Se as eclusas estivessem previstas no projeto original de Itaipu, como seria ideal, o canal seria uma obra a mais dentro do gigantismo da usina. Hoje, afetaria toda a região do entorno.

O município de Guaíra, mais uma vez, sofreria com a obra, como à época foi prejudicada com a construção de Itaipu.

Derrocamento para aumentar a profundidade do canal traria mais problemas a Guaíra. Foto Prefeitura de Guaíra

É que, para tornar navegável o trecho do reservatório e do Rio Paraná na região, será preciso fazer explosões subterrâneas, para retirar as rochas que impediriam a passagem de barcaças, na região onde estão afundadas as Sete Quedas.

Em 1994 e 1995, já foi necessário dinamitar rochas na região de Guaíra, o que provocou muitas queixas da população, principalmente dos pescadores.

O derrocamento, como é chamada a explosão de rochas no rio, é quase uma tragédia ambiental.

NAVEGAÇÃO

Rio Paraná, antes de formar o reservatório de Itaipu. Foto: Márcio Ramalho/Flickr

Em seu estudo, o BID analisou também as condições de navegação a montante (acima) e a jusante (abaixo) da barragem.

A conclusão é que, a montante, no trecho crítico do canal de Guaíra, poderiam passar embarcações navegando a uma profundidade de apenas 2,5 metros, em 73% do tempo.

É por isso que haveria necessidade de explosões no leito do rio, para aumentar a profundidade do canal para 3 metros, conforme o BID alertava.

Já a navegação a jusante é viável em 100% do tempo, “mas é sabido que a velocidade das águas do rio neste trecho pode trazer dificuldades a esta navegabilidade”, dizia o BID.

E A ÁGUA?

Há ainda outras questões importantes, como a água necessária para o canal de desvio de Itaipu.

No Canal do Panamá, para ficar num exemplo bem maior do que o previsto para Itaipu, a água da bacia que abastece o canal de navegação também tem que atender a população de 1,7 milhão de habitantes.

Em 2015, a pior seca registrada no país obrigou a baixar o calado do canal e a reduzir a passagem de navios.

Fortes chuvas, no ano seguinte, normalizaram a situação, mas as mudanças climáticas que o mundo sofre não dão garantias de que fenômenos como o de 2015 não se repetirão.

E EM ITAIPU?

A água do reservatório gera energia, abastece Foz e outros municípios, serve para múltiplos usos. Haveria água para uma eclusa gigantesca? Foto Rubens Fraulini

No caso do reservatório de Itaipu, a água não atende apenas a produção da usina. Pelo Código das Águas, a prioridade é a dessedentação do ser humano; depois, dos animais; em terceiro, o uso múltiplo; e em quarto lugar, a produção de energia.

A Sanepar utiliza a água do reservatório para abastecer parte de Foz do Iguaçu e das cidades vizinhas.

Isso também ocorre em algumas localidades paraguaias. Há ainda muitos sistemas de irrigação que utilizam o reservatório.

Com as eclusas, parte da água que seria utilizada para produzir energia teria que passar pelo canal de navegação.

EM ESTIAGENS

Em períodos normais, praticamente não haveria problemas. Mas em caso de estiagens, como a que vivemos agora? Paralisaria o canal ou reduziria a produção de Itaipu?

O que parece uma maravilha – a integração hidroviária entre Brasil, Paraguai, Argentina e até o Uruguai – pode se tornar uma armadilha para o futuro.

Detalhe: o artigo é de 2018 e já falava em estiagens. Elas continuaram ocorrendo.

E, agora em 2021, o Operador Nacional do Sistema já fala que vivemos “o pior período hidrológico desde 1931”.

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