Este texto não vai trazer respostas. Apenas constatações. O fato: a partir de terça-feira, 30, Foz do Iguaçu prorroga para 23h o horário permitido para circulação. Até esta segunda-feira, era até 20h.
Isso significa quase uma volta à normalidade para muitas atividades, prejudicadas pela falta de freguesia, de público, de clientela.
Em Ciudad del Este, no Paraguai, os comerciantes simplesmente desobedeceram ao decreto presidencial que impedia a abertura de comércios não essenciais. Já no sábado, 60% das lojas abriram. Nesta segunda-feira, por certo, será praticamente normal.
Desobedecer por desobedecer? Não é assim. O comércio paraguaio de fronteira sofreu sete meses com o fechamento da Ponte da Amizade. Houve demissões, fechamento de lojas, desespero. Mal iniciava uma ligeira recuperação, vem de novo o decreto que impede as lojas de funcionarem por uma semana.
“TRABALHO É SAÚDE”
Em todo o Paraguai, os sindicatos que representam micro, pequenas e médias empresas dizem que não vão aceitar a prorrogação da quarentena além de 4 de maio, domingo, e que todas vão funcionar já na segunda-feira seguinte. Mas, até lá, vão ficar fechados (o que não acontece nas cidades da fronteira).
Em comunicado conjunto, que incluiu setores comerciais, os empresários dizem que “a emergência sanitária está longe de terminar e a economia tem que seguir funcionando, sem que (a quarentena) afete apenas alguns setores”.
O comunicado destaca que “trabalho é saúde” e que sem os comércios abertos fica condenada toda a cadeia produtiva.
Os setores que reclamam representam mais de 80% da força de trabalho do Paraguai. Os sindicatos dizem que desde o início têm cumprido os protocolos sanitários para prevenir contágios entre funcionários e clientes, por isso “têm o direito de trabalhar, cuidando-se uns aos outros”.
A OUTRA FACE É A PANDEMIA
Mas o que fazer, quando tanta gente morre e, na verdade, há tanto desrespeito aos protocolos de saúde? Tanto do outro lado da fronteira como aqui, mesmo com todas as restrições, há aglomerações por um ou outro motivo, há gente que não usa máscaras faciais, há festas clandestinas… sempre com a morte rondando.
Só de sábado para domingo, morreram em Foz do Iguaçu 14 pessoas, número só inferior ao recorde registrado em dois outros dias – 16. É muita morte, e de gente em pleno vigor da vida: entre os 9 homens que morreram, há 3 com menos de 50 anos. E outros 2 com 52 e 53 anos. Não é idade pra morrer, a não ser por acidente ou coisa parecida. Havia ainda duas mulheres na faixa dos 50 anos – 53 e 57.
Tem sido cada vez mais frequente o internamento de jovens (bem mais jovens do que esses que morreram) e também torna-se comum a morte de pessoas em faixas etárias e condições de saúde que não são de risco.
ALTO PARANÁ, 7 MORTES POR DIA
As mortes causam terror também no departamento de Alto Paraná, cuja capital é Ciudad del Este. Foram 23 óbitos por covid-19 em três dias, de quinta-feira a sábado, segundo a 10ª Região Sanitária.
Desde o início da pandemia, são 507 óbitos, dos quais 60% eram moradores de Ciudad del Este, 10% de Hernandarias, 9% de Presidente Franco; 6% de Minga Guazú e os restantes 15% se distribuem entre os demais municípios, segundo apurou o jornal ABC Color.
Com uma população mais de três vezes superior à de Foz do Iguaçu, o departamento de Alto Paraná está em situação muito melhor que a de Foz do Iguaçu, onde desde o início da pandemia já morreram 613 pessoas, 106 a mais do que lá.
Mas, embora a situação dos hospitais de Foz seja crítica, a dos hospitais de Alto Paraná é ainda pior, por falta de leitos, de medicamentos e de pessoal. Há 2.091 casos ativos e mais de 130 pessoas internadas, ocupando praticamente todos os leitos existentes, nas redes pública e privada.
FRONTEIRA ABERTA OU FECHADA?
É com base nesses números que a Sociedade Paraguaia de Infectologia pediu ao governo que altere o decreto restritivo em vigor e inclua entre as medidas o fechamento das fronteiras, para evitar a propagação no país da variante P1 do coronavírus, que surgiu no Amazonas e se espalhou pelo Brasil e agora alcança os países vizinhos. É uma cepa de transmissão mais rápida, o que explica o aumento dos casos onde ela está se propagando.
Mas o médico Hugo Kunzle, diretor da 10ª Região Sanitária, que abrange os municípios de Alto Paraná, pondera contrariamente ao fechamento da Ponte da Amizade. Segundo ele, não houve aumento de casos no departamento depois que foi aberta a fronteira. A preocupação, diz, é com a alta circulação comunitária.
“Não vemos necessidade de fechar as fronteiras. O contágio é comunitário e devemos insistir nos bairros”, segundo entrevista que Kunzle concedeu à rádio Monumental 1080 AM.
Ele se preocupa também com os paraguaios que vão às praias do Brasil e podem voltar com o vírus, por isso diz que o setor de Migrações deverá manter um trabalho específico relativo a esta situação.
AUSTRÁLIA CONFINA CIDADE POR TRÊS DIAS
País com 25 milhões de habitantes, a Austrália já voltou a conviver com produções ao vivo, com aulas presenciais e com um retorno à vida quase normal.
Desde o início da pandemia mundial, a Austrália adotou medidas de restrição, controlou as fronteiras e monitorou os casos. Como a maioria dos países fez. A diferença é que lá isso aconteceu com união política, sem que houvesse dois lados digladiando por suas “verdades”.
Resultado: no balanço de hoje, a Austrália registrou 29.260 casos (14% dos 208.655 casos do Paraguai) e 909 mortes (22% do total de 4.063 óbitos provocados pela covid-19 no Paraguai).
Lembrando que a Austrália tem uma população 3,5 vezes maior que a paraguaia.
Talvez a informação a seguir explique essa diferença. Nesta segunda-feira, o governo da Austrália determinou o confinamento, durante três dias, da cidade de Brisbane, a terceira mais populosa do país, com 2,4 milhões de habitantes.
O motivo: surgiram sete casos comunitários ((apenas sete!) de covid-19 da variante britânica, altamente contagiosa. Após esse curto confinamento, o governo espera ter voltado ao controle da pandemia.
Ainda com as fronteiras fechadas, a Austrália está entre os 10 países que melhor souberam atuar na questão sanitária e econômica.
Provavelmente é tarde demais para o Brasil e o Paraguai tentarem seguir os passos dos australianos, que adotaram restrições na hora certa e abertura total também na hora certa. E acertaram.
Como, no entanto, o processo de vacinação vai bem no Brasil, mas ainda é lento, e no Paraguai praticamente nem começou, talvez seja necessário olhar com mais atenção os cuidados com a saúde e a economia que tiveram e têm os australianos. E, também, saber quais são e o que fizeram os outros 9 países.
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