Deixar família, amigos, cidade e estado, em tantos casos o emprego, para atravessar a fronteira do país pelo sonho de um dia exercer a profissão médica. Esse é um desafio aos estudantes brasileiros que cursam Medicina nas faculdades do Paraguai e ainda precisam adaptar-se a uma nova cultura e a outro idioma.
Quiçá parasse aí a lista de adversidades. Brasileiros já formados médicos estão amargando a demora na entrega do diploma em algumas faculdades do país vizinho. Sem a habilitação, não podem participar do Revalida (Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos), no Brasil, a menos que recorram à Justiça, o que também não garante a inscrição.
A falta do diploma os impede de concorrer no programa Mais Médicos, que seleciona pessoal para suprir a carência de profissionais na rede pública de saúde brasileira. Nem podem exercer a profissão no Paraguai. Enquanto aguardam o documento, há mais gastos e desgaste emocional.
Estudantes de Medicina no Paraguai
É necessário não generalizar. Porém, um grupo de estudantes procurou o H2FOZ para expor a situação. Entre eles, a espera pelo diploma varia de três a quatro meses. Conforme os formados em Medicina, o Paraguai estabelece prazo para a entrega da certificação após a conclusão do curso de graduação, o que não é respeitado.
Além da falta de respostas efetivas, estudantes brasileiros reclamam da cobrança de uma taxa extra, uma espécie de “assessoria” prestada por profissionais, sob vista grossa das instituições, para a liberação do diploma, que é um direito do aluno e uma obrigação da faculdade. Esse serviço custa cerca de R$ 3 mil, relataram. Sem a contratação, a espera é ainda mais longeva.
“Eles têm de entregar os diplomas em até 60 dias, o que não acontece”, narra um dos estudantes, pedindo para não ser identificado. “Porém, para tirar dinheiro dos brasileiros, cobram assessorias no valor de R$ 3 mil, mas, mesmo assim, demoram para entregar. Tem pessoas esperando desde julho do ano passado, para você ter ideia”, conta.
Enquanto aguardam, os prejuízos se acumulam. Além de não poderem trabalhar como médicos, os recém-formados precisam continuar arcando com gastos de aluguel, transporte e outras despesas. E há o abalo na saúde. “Isso tudo prejudica a nossa saúde mental. Como a maioria [dos estudantes] tem medo de falar e ser prejudicado, o problema persiste”, relata o brasileiro que explana o problema em nome do grupo.
Conforme os estudantes, a UPAP (Universidade Politécnica e Artística do Paraguay) é uma instituição em dívida com a entrega dos diplomas aos formados em Medicina. “A licenciada [profissional habilitada] que assina os documentos para enviar ao Ministério da Educação trabalha quando quer. A faculdade só tem parentes na equipe profissional”, critica.
Em 27 de janeiro, o H2FOZ questionou a direção da UPAP sobre os problemas relatados pelos estudantes brasileiros. Em uma primeira mensagem, o representante da instituição afirmou que responderia às indagações. Depois, disse que estava de férias com a família e que a secretaria em Assunção, capital do Paraguai, entraria em contato, o que não aconteceu até a publicação desta reportagem. O espaço permanece aberto.
MEC do Paraguai
A reportagem acionou o Ministerio de Educación y Ciencias (MEC), do Paraguai, por meio do e-mail institucional do órgão. E, por WhatsApp, um representante da instituição pública do país vizinho. Até o momento, não houve respostas às questões que retratam as adversidades enfrentadas pelos estudantes brasileiros de Medicina.
O e-mail foi enviado em 27 de janeiro e reiterado no dia seguinte. Sem resposta, a reportagem contatou o representante do Ministério da Educação do Paraguai no dia 28 e, novamente, em 31 de janeiro, por WhatsApp.
O H2FOZ procurou saber do Ministério de Educação do Paraguai os motivos dos atrasos, como é a forma de emissão dos diplomas de Medicina e se é autorizada e legal a cobrança da “assessoria” no valor de R$ 3 mil. Assim como se o tempo de entrega da certificação é igual para brasileiros e paraguaios, qual é o suporte do MEC para quem amarga a espera do diploma e como o órgão fiscaliza os estabelecimentos de ensino em Ciudad del Este.
Os estudantes estimam em 300 o número de graduados esperando o diploma em faculdades de Medicina do Paraguai. Devido à falta de respostas, não foi possível apurar esse número junto às instituições envolvidas.