Empresário paraguaio joga para a atualidade o bordão “La garantía soy yo”

Frase foi usada num comercial de eletrônicos brasileiros, nos anos 1990, mas hoje ficou como verdade histórica.

Acho que você não vai lembrar de um comercial de TV em que um vendedor paraguaio, “disfarçado” de japonês, oferecia um eletrônico ao comprador e dizia, sem que lhe fosse perguntado: “No necesita la garantía. La garantía soy yo!”

Quer dizer, pode ser que você se lembre, se tiver mais de 40 anos. Se for mais novo, já deve ter ouvido essa frase,”la garantia soy yo”. Porque o comercial “pegou” e atravessou décadas.

O anúncio, criado pelo publicitário Paulo Bione, era da Semp Toshiba, na década de 1990, e o bordão ficou tão conhecido que até no Paraguai pensam que era uma prática comum dos compradores – perguntar sobre garantia – e dos vendedores de Ciudad del Este – responder que garantiam o produto.

O empresário paraguaio Luigi Picollo, sócio do Clube de Executivos, publicou no jornal paraguaio Última Hora um artigo justamente com este título: “La garantia soy yo”.

Ele abre o artigo dizendo que, “durante décadas, os brasileiros que vinham fazer compras no Paraguai, quando pediam algum tipo de garantia do bem adquirido, contavam que o vendedor lhes dizia: ‘la garantía soy yo'”.

Picollo conta que, “no Brasil, esta graciosa frase ainda se escuta ao mencionar a intenção de fazer negócios no Paraguai. Fato que continua sendo verdadeiro”.

Em 1987, Ciudad del Este ainda era Presidente Stroessner. Mas já havia produtos “made in Paraguay”. Foto @Retropy (Twitter)

INSEGURANÇA JURÍDICA

Embora desconheça que tudo começou com um anúncio na TV, criado justamente para desestimular o comprador brasileiro a adquirir imitações (na época, produto falsificado era sinônimo de “made in Paraguay), Luigi Picollo cita indicadores internacionais sobre o Paraguai, como o ranking Doing Business, do Banco Mundial, que evidenciam “a insegurança jurídica, a dificuldade de executar e fazer cumprir contratos, (um país) onde o sistema legal não se constitui num marco firme que impõe o cumprimento da lei entre as partes”.

Prossegue o artigo: “em caso de conflitos, expressamos que é melhor um mau acordo que um bom juízo. Vivemos na pele que, para as pequenas e médias empresas, é muito mais severa a exigência de cumprimento das regras do que as aplicadas a grandes empresas, sendo que a lei, teoricamente, é igual para todos”.

“Acredita-se que o Paraguai é um país simples e barato, mas não é. Aqui, toda ação deve necessariamente ter um plano B, que adiciona custos. A confiabilidade nos recursos humanos requer um certo excesso de pessoal para cobrir faltas, erros, instabilidades emocionais. Precisamos de sistemas redundantes de suprimentos básicos, como água e energia elétrica. (…) Constantemente passamos do extremo de estar acelerando em máxima potência para frear com os dois pés.”

O empresário continua sua análise, dizendo que o Paraguai “nunca é tão transparente como acreditamos que seja”, e que “no nosso meio, a pessoa é determinante do êxito de qualquer empreendimento” (…), “enquanto as sociedades que verdadeiramente progridem, no século XXI, têm como determinante a confiança no sistema, no marco legal que aplica a todos, na segurança jurídica de que o contrato será cumprido, onde as pequenas e grandes empresas competem com as mesmas regras”.

É uma crítica severa e séria. Mas não se aplica apenas ao Paraguai. Vale para o Brasil e para qualquer país latino-americano que ainda não chegou ao século XXI de verdade.

O COMERCIAL

O que chamou a atenção no artigo, à parte a contundência, foi saber que o que apareceu num comercial divertido (e hoje politicamente incorreto) dos anos 1990, acabou se tornando uma verdade histórica, de que aquilo era comum nas negociações entre os compradores brasileiros e os vendedores de muamba do Paraguai.

Nos anos 1980 e 1990, principalmente, era tão forte o comércio em Ciudad del Este que havia muambeiros especializados em trazer produtos falsificados, inclusive uísque e cigarro. Marcas de cigarros brasileiros como Shelton, por exemplo, eram falsificadas em fabriquetas paraguaias e vendidas não só no outro lado da fronteira, como no centro de Foz e até em bares (provavelmente, dessas fabriquetas surgiram as que hoje abastecem ilegalmente metade dos mercados no Brasil, Paraguai e Chile).

Uísques eram falsificados aos galões, principalmente os mais procurados pelos brasileiros, que muitas vezes eram levados à casa dos compradores, nas grandes cidades, pelos pequenos contrabandistas (alguns deles recolhiam os cascos e transformavam uísque brasileiros baratinhos em “legígimos escoceses”).

O comercial da Semp Toshiba (veja a seguir) mostra um “paraguaio” que se passa por “japonês”, pra comprovar que o que vende é legítimo. Afinal, ele garante.

https://www.youtube.com/watch?v=-fKQEv5qEGA

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