Os protestos que ganharam as ruas do Paraguai, pelo sétimo dia consecutivo, acabaram conquistando as páginas até do jornal mais influente dos Estados Unidos, o New York Times.
Na versão on line, em texto que pode ser lido em inglês ou espanhol, o jornal publica a reportagem “Indignação no Paraguai: a corrupção e o aumento de casos de covid-19 geram protestos”.
A reportagem, assinada por Santi Carneri e Daniel Politi, lembra que o país vizinho conseguiu, durante quase um ano, manter a pandemia sob controle. “Agora, não”.
A taxa de infecção pelo coronavírus “disparou”, o que deixou no limite o sistema sanitário, “já por si mesmo instável”. Foi essa situação, aliada à falta de vacinas, que nos últimos dias levou milhares de manifestantes às ruas, pedindo a renúncia ou destituição do presidente Mario Abdo Benítez.
“Para muitos paraguaios, a corrupção e os privilégios das elites, que antes eram somente fatos desagradáveis da vida, se tornaram intoleráveis durante a pandemia”, diz o NYT.
A crise nos hospitais, onde faltam medicamentos e recursos em geral, como criticava, antes sozinho, o pessoal de saúde, “se estendeu às ruas com um nível de ódio que os líderes do país nunca tinham enfrentado em anos”.
DESAFIOS DA AMÉRICA LATINA
Para o NYT, os distúrbios no Paraguai são uma amostra dos enormes desafios que a América Latina enfrenta, à medida que o vírus continua cobrando um grande número de vítimas, “enquanto os governos lutam por proporcional uma atenção adequada à saúde e para adquirir vacinas suficientes”.
A América Latina, diz o jornal, conta com pouco mais de 8% da população mundial, mas já soma um quarto das mortes confirmadas por covid-19.
No Paraguai, as taxas oficiais de casos e mortes estão abaixo dos picos sofridos por grande parte do mundo, incluindo os Estados Unidos, “mas estão piorando – o número de novos contágios diários duplicou em menos de um mês, até alcançar o nível mais alto registrado até agora – , inclusive, enquanto outros países melhoram”, afirma o jornal.
O NYT destaca ainda que, com 7 milhões de habitantes, o Paraguai, até a semana passada, só havia recebido 4 mil doses da vacina russa Sputnik V. No fim de semana, o Chile doou 20 mil doses, fabricadas pela empresa chinesa Sinovac.
“A recessão provocada pela pandemia agravou a pobreza, a desigualdade e a insegurança alimentar na América Latina, igualmente como em todo o mundo, o que agravou as frustrações com o manejo do vírus”. Cálculo recente da Cepal – Comissão Econômica para América Latina e Caribe, das Nações Unidas – mostra que 209 milhões de pessoas viviam em situação de pobreza, nos meses finais de 2020, um aumento de 22 milhões em relação ao ano anterior.
“No Paraguai, a base da crise atual inclui a corrupção, a pobreza e um frágil sistema de saúde”, diz The New York Times. E cita Verónica Serafini Geoghegan, economista do Centro de Análise e Divulgação da Economia Paraguaia, uma organização não governamental: “Com a pandemia, os problemas se exacerbaram, mas já existiam deste muito antes”.
BOM INÍCIO
Para o NYT, o Paraguai foi aplaudido, junto com o Uruguai, por tomar medidas rápidas e decisivas que mantiveram reduzidos os surtos de coronavírus durante os primeiros meses da pandemia. Mas o contágio começou a aumentar no final do ano passado, levando as unidades de cuidados intensivos ao limite.
A demissão do ministro de Saúde Pública, Julio Mazzoleni, e de outros três integrantes do gabinete do presidente, durante o último final de semana, não aplacou as manifestações, diz o jornal.
“Muitos manifestantes dizem que têm a intenção de permanecer na rua até que caia o governo.” As palavras de ordem da rua são: “Eleições já”!; “Que renuncie Marito”, em referência ao apelido do presidente.
O ministro de Relações Exteriores do Paraguai, Euclides Acevedo, disse que o governo se esforça para que os fornecedores entreguem as vacinas, enquanto o Ministério de Saúde Pública declarou estado de alerta vermelho sanitário.
“O Paraguai está decidido a obter vacinas sejam de onde forem e como forem”, disse Acevedo. “Aqui todos têm que vacinar-se, e gratuitamente. Esta é a política do governo”, afirmou o ministro.
Mas o governo não convence os manifestantes. Muitos jovens, conclui a reportagem do NYT, dizem que já esperaram muito tempo para ter um governo decente.
“Não vamos parar até que Marito renuncie”, disse a manifestante Melisa Riveros.
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