Observatório de Gênero e Diversidade: uma história de ativismo na fronteira

Leia o artigo produzido por Cleusa Gomes, Elane Dornelles e Natalia Fuentes, especial para o H2FOZ.

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Saiba mais sobre o Observatório de Gênero e Diversidade na América Latina e Caribe, criado em 2018 pela Universidade Federal da Integração Latino-Americana, no artigo especial escrito por Cleusa Gomes, Elane Dornelles e Natalia Fuentes.

Esta publicação integra o caderno especial produzido pelo H2FOZ para celebrar o aniversário de 110 anos do município de Foz do Iguaçu (clique aqui para conferir todo o conteúdo).

APOIO ESPECIAL

Observatório de Gênero e Diversidade Latino-Americano: Uma história de escrita, políticas públicas e de ativismo na tríplice fronteira de Foz do Iguaçu

Resumo

O Observatório de Gênero e Diversidade na América Latina e Caribe da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) criado pela portaria IMEA 003/2018 e publicado 21/06/2018. A proposta da criação do observatório de pesquisa e políticas públicas de Gênero e Diversidade na América Latina e Caribe visa criar no ambiente universitário, institucional e da sociedade civil, assim como na Região da Tríplice Fronteira de Foz do Iguaçu e região, um espaço de articulação de fomento à pesquisa, ao ensino e à extensão sobre a temática do Gênero, Políticas Públicas e Diversidade na América latina e Caribe com o propósito de reunir pesquisadoras/es, grupos temáticos e de trabalho da Instituição, entidades externas e órgãos da sociedade civil e não governamentais em prol da valorização da equidade de gênero, raça, classe e sexo e viabilização de políticas públicas voltadas para a diversidade na América Latina. Logo, a proposta deste artigo é trazer à tona um pouco da história do Observatório, assim como a rede de instituições que trabalham com a política de violência de gênero na fronteira, além de uma das principais ações no momento pela instituição, que é o monitoramento e levantamento de dados sobre esta temática na região. Também, apontar os avanços e os desafios na implementação de políticas públicas de Gênero e Diversidade na Cidade de Foz do Iguaçu.

1. Introdução

Na cidade de Foz do Iguaçu, no Brasil, que faz fronteira com Ciudad del Este (Paraguai) e Puerto Iguazú (Argentina), no dia 21 de junho de 2018 por meio da portaria IMEA 003/2018, nasce o Observatório de Gênero e Diversidade Latino Americano, vinculado a Universidade Federal da Integração Latino América (UNILA), como fruto do ativismo político da coordenação do observatório e pela necessidade emergente de políticas de integração mais eficaz, de orientação de programas de diversidades além de dar voz a inúmeras pautas e necessidades do tema de gênero na região de fronteira.


APOIO ESPECIAL

Neste espaço tempo de criação do observatório, em um primeiro momento, como forma de sistematizar as ações e de levantar as necessidades do território, houve o fomento de investigações, por parte das pesquisadoras/es que passaram a integrar o observatório, como forma de estabelecer um cronograma de pesquisas e de ações que seriam implementadas nos anos seguintes.

O perfil das pesquisadoras do Observatório procura ser diverso, priorizando a participação das mulheres, incluindo as pessoas trans, com suas singularidades e interseccionalidades, em todas as fases da vida, incluindo mães, estrangeiras, negras, LGBTQIAPN+ em todos os níveis da Universidade.

Com isso, foi criado o site do observatório e iniciou-se uma pesquisa tanto institucional, integrando as representações governamentais ou não do município, tanto para coleta de dados como para fomento de ações pertinentes ao tema de gênero, como uma investigação a respeito da violência de gênero no município. Este movimento ao longo dos anos fez com que o observatório ganhasse corpo, responsabilidades, credibilidade e ações que resultaram em diversas pesquisas, relatórios e políticas que estão em andamento e serão resumidas nos próximos parágrafos.

Além de três países, fronteira reúne moradores de dezenas de nacionalidades. Foto: Marcos Labanca
Além de três países, fronteira reúne moradores de dezenas de nacionalidades. Foto: Marcos Labanca

2. O Observatório de Gênero como espaço de pesquisa

Desde os primeiros anos após a sua criação, o Observatório de gênero e Diversidade Latino Americano têm como um dos seus principais objetivos a pesquisa e o monitoramento das violências de gênero no território, como forma de diagnosticar e sistematizar estes dados com vista a implementação e fomento de políticas públicas de inclusão e de proteção de gênero, raça, classe e sexo.

Desde o início, há uma preocupação quanto a necessidade de falar, pesquisar e combater a violência de gênero que é um dos maiores entraves à paridade participativa por parte das mulheres, pois ao serem vítimas de violência de qualquer tipo, mulheres lésbicas, transexuais, brancas, pretas, indígenas, pobres, de classe média, trabalhadoras, estudantes, idosas e jovens são desencorajadas a pronunciar suas falas e, portanto, a participar em igualdade no espaço público e privado.

Uma das publicações em que participa uma das principais integrantes do Observatório como a pesquisadora, a Dra. Cleusa Gomes da Silva (coordenadora e fundadora do Observatório), que está como organizadora e autora de um dos capítulos, e que consta no site é a coletânea intitulada: “Perspectivas transculturais e transnacionais de Gênero”.

Outra publicação importante, que consta no site, chama-se “Por elas e por nossas lutas: igualdade e justiça nos debates de gênero e diversidade nas sociedades contemporâneas”, redigido pela professora e Dra. Renata Peixoto de Oliveira, e a Integrante e atual vice-coordenadora Regiane Cristina Tonatto. Diversas outras publicações das pesquisadoras do grupo, que no momento consta com 9, foram realizadas com a temática de gênero.

No que se refere ao conteúdo das pesquisas encabeçadas pelo Observatório, o principal agente motivador da maior parte das pesquisas são os dados alarmantes sobre a violência contra as mulheres que acontecem em todos os anos. Esses são dados muito preocupantes que comprovaram a expressão das relações de poder entre homens e mulheres por meio da coação e violência. Os dados se tornam mais graves para as mulheres negras, nativas e transexuais, conforme as últimas pesquisas nacionais.

Como um dos projetos principais do Observatório, o Mapa/Monitoramento da Violência de Gênero na Tríplice Fronteira, cujo propósito é subsidiar políticas públicas na região, fornecer dados relevantes para a comunidade e fortalecer as entidades, tanto na comunidade quanto na universidade, que se empenham em minimizar o problema da violência contra as mulheres na tríplice fronteira.

A relevância desta pesquisa reside na necessidade crítica de compreender a extensão e natureza da violência de gênero, visando o desenvolvimento de estratégias mais eficazes para combater este problema alarmante. Os dados coletados são fundamentais para a formulação de políticas mais informadas, proporcionando uma base sólida para intervenções e aprimoramento dos esforços já existentes.

A partir do projeto de monitoramento, foram contatadas diversas instituições. Os dados preliminares obtidos serão apresentados aqui sendo os primeiros disponibilizados pelas seguintes entidades: o Centro de Análise, Planejamento e Estatística (Cape) e do Centro de Referência de Atendimento à Mulher (CRAM). O recorte temporal definido pela equipe de pesquisadoras abrange o período de 2013 a 2023.

Mulheres vítimas de violência contam com o apoio do CRAM – foto ilustrativa: Freepik


No entanto, para que esta pesquisa tivesse corpo e manutenção necessários para o andamento da pesquisa, se fez necessário o financiamento da pesquisa. Neste sentido, um ator muito importante de parceria foi o Parque Tecnológico da Itaipu (PTI), que deu apoio para 2 bolsas de pesquisa, sendo uma para a graduação e outra para o mestrado, por meio de edital específico, no final de 2023. Este passo foi de extrema importância, dado que até o momento a maior parte das ações do observatório se deu de maneira voluntária.

Após o início das atividades das bolsistas, o monitoramento passou a ser feito com base nos dados disponibilizados por Instituições locais. Uma delas é o Centro de Análise, Planejamento e Estatística (CAPE), encarregado de examinar e mapear a criminalidade em todo o Estado do Paraná. Este setor monitora continuamente os registros criminais em detalhes, identificando áreas mais vulneráveis para fornecer informações aos gestores.

Além disso, oferece suporte ao planejamento de operações sistemáticas e ações abrangentes de Segurança Pública, como a distribuição de viaturas e alocação de efetivo policial, sempre que solicitado (Paraná, 2024).

Outro ator importante para a sistematização dos dados é o Centro de Referência de Atendimento à Mulher (CRAM), onde obtivemos relatórios referentes aos anos de 2020 a 2023, uma vez que os registros anteriores não eram digitalizados. Atualmente, nossa equipe de pesquisadoras está levantando manualmente os dados dos anos anteriores.

As mulheres que enfrentam situações de violência são acolhidas no CRAM – Centro de Referência de Atendimento à Mulher, onde recebem suporte especializado para superar essas circunstâncias. Os serviços oferecidos são atendimento psicológico, social e jurídico; auxílio jurídico; orientação preventiva e assistencial; articulação com outras instituições: facilitação do acesso a programas de educação formal e não formal, além de meios para inserção no mercado de trabalho (CRAM, 2024).

Com base nos dados de nacionalidade cedidos pelo CRAM, referente aos atendimentos pela instituição, temos as Brasileiras que em 2020 o número de atendimentos foi o mais alto, com 1131 atendimentos, caindo para 727 em 2023. O Paraguai é a segunda nacionalidade com mais atendimentos, com um pico em 2021 (71 atendimentos) e uma queda para 37 em 2023. Já o número de atendimentos de mulheres venezuelanas aumentou significativamente em 2022, atingindo 21 atendimentos, antes de diminuir ligeiramente para 15 em 2023. Este aumento pode estar relacionado ao fluxo migratório venezuelano devido à crise em seu país de origem.

As outras nacionalidades apresentam números de atendimentos relativamente baixos e estáveis ao longo dos anos. Por exemplo, a Argentina teve uma leve variação, de 8 atendimentos em 2020 a 14 em 2023.Nacionalidades como Bolívia, Colômbia, Haiti e Cuba têm variações menores, mas não chegam a valores tão significativos quanto Brasil e Paraguai.

As políticas Intersetoriais e o Observatório

Referente às políticas intersetoriais, desde a sua fundação o observatório se coloca como instituição parceira de proposições para uma melhor inclusão e proteção das mulheres e comunidade LGBTQIAPN+, com base em ações inclusivas e de participação da sociedade civil em prol desta temática.

Com base neste propósito, o observatório em 2022 tomou posse, como sociedade civil, no comitê LBGTQIAPN+ da Secretaria de Direitos Humanos de Foz do Iguaçu, com o objetivo de contribuir e fortalecer políticas de gênero e diversidade na cidade. Além disso, o Observatório participa da Rede Encontros Pela Diversidade e é uma das organizações responsáveis pela Marcha das Mulheres em Foz do Iguaçu. Atualmente, o Observatório é composto por 18 instituições que trabalham em conjunto para promover e fortalecer políticas de gênero e diversidade na cidade. Essas instituições incluem organizações não governamentais, universidades, grupos comunitários e outras entidades comprometidas com a defesa dos direitos humanos e a promoção da igualdade.

Outra ação importante, foi a confecção de um relatório de Gênero e Diversidade da tríplice fronteira, apresentando dados oficiais nacionais dos três países, assim como das cidades de Foz do Iguaçu, Ciudad del Este e Puerto Iguazú, como pontapé inicial das necessidades de ações de gênero para fronteira.

Este relatório serviu de base para o fomento de ações para a implementação do projeto da Casa da Mulher Brasileira, onde o observatório é uma das instituições parceiras da região neste projeto. Um dos pontos chaves que o observatório tem buscado e alcançado com estes relatórios e projetos é a implementação de uma rede eficaz de proteção, maior adesão da legislação vigente quanto a proteção e inclusão das mulheres (incluindo mulheres trans) nas instituições público e privadas, além de visibilidade as pesquisas realizadas pelas instituições de ensino parceiras do Observatório.

Considerações finais

A fronteira é um fenômeno não somente espacial e histórico, mas uma confrontação cultural, ideológica e econômica em que diferentes sujeitos são constituídos em sua diversidade étnica, racial e cultural (MENEGHEL,2022). Não à toa o termo diversidade latino-americana, carregado não apenas em seu nome, mas na constituição das pesquisadoras (de várias nacionalidades e Estados brasileiros), se faz como uma das bases metodológicas e praticas que a instituição busca reconhecer e praticar ao longo dos últimos anos.

Espera-se que através dos projetos base do observatório, como o mapeamento da violência, assim como as cadeiras de participação em diversos espaços institucionais, possam promover uma provocação a uma política de fato inclusiva e representativa do gênero, raça e diversidade da tríplice fronteira.

Autoras:

Dra. Cleusa Gomes, Elane Dornelles e Natalia Fuentes, integrantes do Observatório de Gênero e Diversidade da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila).

3. Referências Bibliográficas

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