Puerto Iguazú, memória do tempo de dolarização e crise

Leia a opinião do portal sobre as eleições e planos econômicos na Argentina, e o impacto na fronteira.

A dolarização da economia volta a rondar a Argentina, ideia acesa no palanque das eleições presidenciais deste ano. Cartada de um dos concorrentes à Casa Rosada, na prática, essa proposta representa instituir por decreto, da noite para o dia, a paridade entre o peso e a moeda estadunidense.

O lampejo ocorre três décadas depois que o país vizinho experimentou viver sob a economia atrelada ao dólar, medida anunciada como solução para os problemas que, colocada à prova da vida, ficou bem longe desse objetivo. Eram tempos do plano de estabilização e ajuste fiscal do ex-presidente Carlos Menem (1989-1999) e seu ministro Domingo Cavallo.

O que se decide em Buenos Aires, a capital, impacta a fronteira. No começo da década de 1990, Puerto Iguazú vivenciou uma quebradeira histórica, a qual fez sucumbir o turismo e o comércio, segmentos indutores da economia fronteiriça, desestimulando visitações e compras em um mercado que era aquecido.

Afirma-se que o futuro é um juiz imparcial da história, que sempre chega atrasado. Por isso, convém revisitar o passado imoderadamente. A reestruturação econômica argentina baseada na dolarização levou cerca de 300 lojas de Puerto Iguazú a fechar as portas, em três anos, registrou o jornal Ponte da Amizade, na edição de 19 de julho a 1.º de agosto de 1994.

Manchete do periódico iguaçuense Nosso Tempo na edição de 23 de março de 1990.


O periódico iguaçuense Nosso Tempo levou às suas páginas reportagem crítica sobre a situação econômica e social portenha, na edição de 23 de março de 1990. Na capa, expôs com letras garrafais a gravidade do quadro da época: “Argentina destroçada tenta em vão emergir do precipício”. Clique aqui e veja matéria da época.

Sem risco de exagerar, Puerto Iguazú virou uma “cidade fantasma”, chegando ao fundo do poço da crise social e econômica. A penosa recuperação ocorreu com os efeitos do plano econômico brasileiro da época, que instituiu a Unidade Real de Valor (URV), entre outros ajustes, dando poder de compra ao Real no outro lado do Rio Iguaçu.

Brasileiros, turistas e moradores da região, retornaram ao comércio, turismo e gastronomia de Puerto Iguazú. A redescoberta movimentou lojas de alimentos, bebidas e confecções, principalmente jaquetas de couro e blusas de lã. Restaurantes e bares voltaram a ser frequentados, com atrativos como o “menu turístico”, churrasco e vinho, assim como os jogos, chegando ao reforço dos free shops anos depois.

O plano histórico mostra que a degradação institucional fez a próspera Argentina conhecer as mazelas sociais e a falência econômica. O país mergulha em um sem-número de instabilidades e crises que perpassam, mais recentemente, a derrocada dos militares, com a vexatória aventura da Guerra das Malvinas, e governos civis, que perfilam-se no poder desde Raul Alfonsín, nos anos oitenta.

De volta à fronteira: o resultado das recentes prévias das eleições presidenciais argentinas balançou ainda mais a economia, causando em Puerto Iguazú desabastecimento e alta dos preços da comida. Subiram os custos de produtos essenciais, como azeite e carne, revela reportagem exclusiva do H2FOZ.

O resultado das primárias, que antecedem as urnas, sugere que o eleitor demonstrou reprovação ao atual quadro de inflação e carestia, resgatando o chamado “voto castigo” aplicado em outros pleitos contra governos de turno. A história está para mostrar que, muitas vezes, o castigo pode recair sobre a parcela mais fraca, a que já arca com o elevado custo das decisões políticas.

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