Petrópolis e o nosso quintal

Aida Franco de Lima – OPINIÃO

A situação em Petrópolis é avassaladora. Até o momento os desmoronamentos e enchentes causaram 136 mortos, 200 desaparecidos e milhares de pessoas desabrigadas. No último dia 15, terça-feira, choveu 230mm. O que cairia no mês inteiro, despencou em 3 horas! Foi chuva demais, para um região delicada e ocupada por moradias, que em situações cotidianas já são impactadas. Se estamos vivendo o ‘novo normal’ da Covid, temos mais um exemplo do ‘novo normal’, do clima. Você se lembra de quando tínhamos terrenos com terra? Aquela terra roxa, a mesma que apelidou os moradores de Foz e do Paraná de modo geral como ‘pés vermelhos’ ?

Naquela época, quando tudo aqui era mato, chovia em um dia e depois a água acumulada nesses terrenos era absorvida vagarosamente pela terra, o sol ia secando o terreno e formavam aquelas cascas que pareciam chocolate. Lembram? Uma pessoa conhecida fez até uma brincadeira daquelas que não se faz: deu um pedaço desse ‘chocolate’ para um professor! Se ele reprovou na disciplina dele, não sei dizer. Esses terrenos de Foz, do Paraná, do Brasil, estão cada vez mais impermeabilizados! Chove e imediatamente está tudo seco! E se o solo não absorve mais a água, ela escorre, procura um fluxo e vai embora. E se for em grande quantidade, leva tudo que tem pela frente.

Nossas cidades estão cada vez mais acimentadas. Os paralelepípedos, sempre muito comuns nos postos de combustíveis, nem mesmo nesses locais são encontrados com facilidade. As calçadas ecológicas, são raras, porque dá trabalho manter o gramado, pagar jardineiro. Vem o cachorro do vizinho e faz suas necessidades, melhor não!

Goiaba normalmente brota pelos quintais, gera frutos, sombra e sim, muitas folhas para varrer, ou deixar se transformar em adubo. Foto: Aida Franco de Lima

Os quintais, lembram? Há lei que obriga que uma parte do terreno não seja concretada. Quem respeita? Quem fiscaliza? Na minha casa já teve de tudo! Bananeira, caqui, maçã, uva, manga, mamão, limão. Ainda temos um pequeno espaço sem concreto e cultivamos romã, limão, jabuticaba, amora, poncã, pitaia, pitanga e recentemente até brotou um monte de pés de mamão! Dá trabalho para manter? Sim. Seria mais fácil concretar tudo? Claro. A cada época de podas tem que ser contratada uma caçamba, quando venta as folhas se espalham por tudo. Porém, temos frutas, temos um descanso visual, tem as aves que vem comer e precisam fugir dos gatos (mas isso é outra história) e ainda, enquanto as pessoas reclamam muito do calor, nossas pequenas árvores nos devolvem frescor.

E o que tudo isso tem a ver com Petrópolis? Naquela região, de acordo com Giovanni Dolif, meteorologista e pesquisador do CEMADEN –  Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, em entrevista à CBN, são 500 áreas expostas a riscos, pois são moradias construídas onde não deveria haver habitantes. Dolif relembrou que já tivemos tragédias similares em 2008, em SC; em 2010, no Nordeste e Niterói e em 2011 na região serrana do Rio. Ou seja, um filme trágico que já conhecemos o roteiro.

As sementes transportadas pelas aves, quando encontram um pedacinho de solo livre do cimento, crescem com gosto!
Foto: Aida Franco de Lima

É a história que está resumida em nossos quintais e cidades, que ainda não sofrem com alagamentos ou desastres similares. Quanto mais retiramos a vegetação do solo e o impermeabilizamos, mais expostos estamos às reações naturais. As pessoas que moram nos pés dos morros em Petrópolis ou fundos de vales de ouras regiões do Brasil são as que mais sofrem. Um País com a dimensão geográfica do Brasil, precisa mesmo que as pessoas morem nas áreas que não deveríamos pavimentar, nas áreas que não deveríamos desmatar, nos locais onde nossos rios deviam correr livres e não sufocados pelos canais de concreto? Com a quantidade exorbitante de impostos e taxas que pagamos, quando é que isso irá retornar a quem mais necessita?

Áreas centrais de Petrópolis, RJ, completamente alagadas e casas soterradas, ao pé do morro. Foto: Pagodão 24 horas

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