Bosque dos macacos: faltou combinar com os bichos

Área verde, em terreno particular, que integra-se ao Bosque dos Macacos dará lugar a condomínio residencial

Aida Franco de Lima – ARTIGO

Na copa de 1958, o técnico da Seleção Brasileira Vicente Feola teria reunido os jogadores e traçado o plano infalível para vencer a partida contra a União Soviética, descrevendo como fariam os lances. Então, Garrincha, com simplicidade ou ironia, questionou: “mas o senhor já combinou isso tudo com os russos?”. Quando discutimos sobre a preservação de uma área verde em vias de ser derrubada e uma parte alega que a lei permite e o outro lado questiona, é a mesma situação… Alguém combinou com os animais do Bosque dos Macacos, que eles teriam que sair da área vizinha, porque um trecho da mata seria derrubada?

Não interessa se um trecho da floresta é particular. Os animais, a flora, os rios, os elementos naturais desconhecem essas linhas inventadas pelos homens. Eles pertencem ao local tanto quanto o local a eles.

Em Foz do Iguaçu, uma área verde de 1.528,21 m², com árvores nativas, próxima ao Bosque dos Macacos foi desmatada para dar lugar a um condomínio. A autorização foi concedida através de requerimento da proprietária do terreno, a PPG CONSTRUÇÕES E INCORPORAÇÕES LTDA, via SINAFLOR – Sistema Nacional de Controle da Origem dos Produtos Florestais.  Era sábado de manhã, 23 de abril, e os macacos estavam alvoroçados perto do asfalto. Pelo visto, não fizeram o manejo, não combinaram com os bichinhos que eles tinham que sair de suas moradias para que os humanos tomem posse da área.

Imagens capturadas durante o desmatamento de terreno ao lado do Bosque dos Macacos, no sábado, dia 23 de abril. Vídeo: divulgação

Um amigo biólogo me contou uma vez que quando uma área é alagada e vimos as imagens de resgates de animais, antes que tudo fique submerso, parece mesmo algo para inglês ver. É uma coleta superficial, de algumas espécies que por acaso conseguem se resgatadas. E soltas em outros locais, em que provavelmente haverá impacto, pois estarão em território que naturalmente já deve ter seus moradores. Se nem Noé colocou todos os animais na arca… Imaginem, então, quando nem há a tentativa de resgatar espécies animais e vegetais.

Será mesmo que não tem outra local, que não seja com floresta, que não seja moradia de animais, para lascar cimento? Será que sempre a natureza quem vai pagar o pato? Antes de ser área particular, tudo ao lado dos Bosque dos Macacos e toda e qualquer outro espaço geográfico, sempre foi da natureza, sempre foi da coletividade. Estamos em 2022, há lugares no Paraná em que a energia ainda não voltou, por causa da última tempestade do fim de semana, e parece que quem tem a caneta ainda não conseguiu ligar o lé com o cré: quanto mais devasta, mais lenha na fogueira das tempestades! A empresa não é filantrópica, ela visa lucros. Cabe ao Estado, no caso o Município de Foz do Iguaçu, propor alternativas para negociar a preservação da área em troca de outra área, dinheiro em espécie, desconto em impostos ou qualquer outra saída que não seja derrubar árvores!

Empresa teve concedida liberação para o desmate
Documentos comprovam a liberação para o desmate, em terreno sinalizado no mapa. (Fonte: Divulgação)

Além de desabrigar a fauna, de modo abrupto, há também consequências na forma em que novos loteamentos surgem da noite para o dia. Nesse e em outros casos similares, as redes de esgoto, saúde, educação, segurança, transporte e assim por diante, também serão preparadas para que recebam as inúmeras famílias que de uma hora para a outra vão impactar a região? Quando um loteador resolve vender o sonho da casa própria para uma, duas, mil famílias, ele combina com o Município a demanda que isso vai gerar para a cidade como um todo?

O responsável justificou que pagou impostos por anos, que conseguiu todas as liberações dos órgãos responsáveis, por parte da Prefeitura e do IAT – Instituto Terra e Água. Porém, com a repercussão do caso, depois que as árvores, literalmente, tombaram inclusive para a área além da particular, a derrubada foi paralisada para que nova medição seja feita. Para, inclusive, delimitar o que é público do que é privado. Sempre o mesmo enredo, e os macacos que lutem! Vale a pena mesmo desmatar uma área, sob a justificativa que serão plantadas o triplo, o quádruplo, de espécies que talvez irão ficar adultas daqui um meio século?

Ah sim, o Brasil venceu por 2×0 o jogo contra a União Soviética em 1958, mas está perdendo de goleada para o desmatamento.

Art. 2º O PMMA (Plano Municipal de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica) de Foz do Iguaçu tem como objetivo principal estabelecer estratégias para a proteção da Mata Atlântica por meio da conservação dos fragmentos de vegetação nativa e da recuperação de áreas degradadas, para tanto, foram definidos os seguintes objetivos específicos: I – diagnosticar a situação do município quanto aos fatores que influenciam o bioma; II – definir a visão futura do município referente à preservação e recuperação dos remanescentes da floresta de mata atlântica de Foz do Iguaçu; III – propor plano de ações de preservação e recuperação dos remanescentes locais; IV – definir ações de monitoramento do Plano Municipal de Mata Atlântica.

A Lei 11.428/2006 prevê autorização para a retirada de vegetação em áreas da Mata Atlântica, mas a norma exige compensação ambiental quando a supressão é autorizada, seja por plantio ou destinação de área para preservação. Quando a área for superior a 50 hectares em meio rural ou 3 hectares em área urbana (exceto em edificações e loteamentos), terá de haver autorização do Ibama antes, para depois sim, ter a anuência do órgão ambiental estadual. Segundo a IN 09/2019, nos casos de cortes que não tiverem o aval do Ibama, serão aplicáveis sanções e haverá a obrigação de compensação ambiental de pelo menos o dobro da áreas desmatadas como reparação ao dano ambiental causado. (Fonte: O Eco)

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