Diamantes, crianças e vinhos

As joias que teriam sido presente da Arábia Saudita à ex-primeira dama Michele Bolsonaro, ao chegarem de forma ilegal ao Brasil, foram retidas pela Receita Federal

Por AIDA FRANCO LIMA | OPINIÃO

A história que o Estadão revelou, no dia 3 de março, sobre as joias que o ex-presidente Jair Bolsonaro trouxe para o Brasil ilegalmente, avaliadas em R$ 16,5 milhões, a cada dia ganha mais um pingente. Os objetos, que são espécies de sonho de consumo, inatingível à esmagadora maioria da população brasileira, teriam sido um singelo presente da Arábia Saudita à ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.

Ocorre que não haveria problema algum em trazer presentes doados aos representantes brasileiros desde que os bens não fossem incorporados aos seus acervos pessoais, e sim ao do Estado. Ou seja, as joias foram doadas ao Brasil, que quis o destino, naquela ocasião, tinha no comando o citado casal.

O material foi encontrado na mochila de um assessor, que ficou encarregado de efetuar o transporte do presente – que teria sido ofertado, e aceito, durante viagem oficial da representação brasileira em outubro de 2021. Imagine se essa história tivesse vindo à tona naquela mesma época ou um  ano depois, bem no período eleitoral?

O quiproquó se deu porque, no entendimento de quem estava temporariamente ocupando o lugar de presidente, ele queria o presente para sempre. Desejava levar os diamantes junto da mudança que faria um ano depois, findado o período eleitoral e após ter perdido a eleição.

Essa história, que a cada dia envolve mais personagens e versões tão diferentes de um mesmo fato, é mais um exemplo da falta de retidão por parte de quem se senta na cadeira presidencial. E isso tem reflexos políticos, talvez podendo arranhar ainda mais a imagem bastante desgastada e conflitar com vários aspectos legais.

Diante dessa novela das joias, lembrei-me de duas situações. Primeiro a que a gente aprende e fala às crianças: “Não mexa no que não é seu.” Se a família Bolsonaro não tivesse cobiçado o que era do povo brasileiro, não estaríamos falando desse assunto.

A segunda coisa é sobre como comportar-se diante de situações inusitadas em que um belo dia uma autoridade da Arábia Saudita resolve dar um presente tão valioso que faz os olhos brilharem. Um autor brasileiro, que estou na dúvida entre Franklin Martins ou Joelmir Beting, ambos ótimos, tem uma dica para a pessoa ingênua ter um parâmetro sobre aceitar ou não um presente.

Se a pessoa tem receio em receber algo, para que isso não manche sua reputação, estando na dúvida se aquilo é um presente, propina ou jabá, na linguagem jornalística, um caminho é perguntar: consigo retribuir com algo do mesmo valor?

Por exemplo, se uma pessoa ganhar um Vinho do Avô, por R$ 17,90, e conseguir retribuir, tudo bem. Mas e se for um Domaine Leroy Musigny – Grand Cru, cujo valor médio é de R$ 60 mil a garrafa? Não entendo de vinho, porém o Google me ajudou.

Se a resposta for: “Não, não tenho condições de retribuir com algo do mesmo valor”, aí também não é indicado receber o presente. 

E vou adiante. Além de conseguir, gostaria de fazê-lo? Gostaria, de fato, de tirar esse valor da conta ou apenas somar a ela? Se a resposta for: “Sim, tenho condições de pagar algo do mesmo valor.” Então o caso estaria resolvido. Bastaria sacar das contas pessoais o mesmo valor, pagar os devidos impostos e a questão estaria encerrada. Não iriam nem os dedos e ficariam todos os anéis, brincos, colares, relógios e tudo mais que faz com que os olhos brilhem.

Este texto é de responsabilidade do autor/da autora e não reflete necessariamente a opinião do H2FOZ.

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