Você tem fascínio por crimes e serial killers? Epa! Isso é normal?

É difícil desgrudar da tela quando se tem pela frente um criminoso inteligente, articulado, insuspeito. As provas se acumulam, mas ele permanece inabalável. E aí…

* Cláudio Dalla Benetta

Meu caro, minha cara. Você conhece um serial killer? Ah, dirá você, é coisa de cinema. Ou, no mínimo, é um problema dos americanos. Nem uma coisa nem outra. Aqui no Brasil, há pelo menos cinco famosos serial killers. Sem contar os que até hoje nem foram descobertos.

Ah, e não fique sossegado ao pensar que só homens podem ser “seriais”. Há na história muitas e muitas mulheres que cometeram crimes em série.

Os métodos que elas usam são um pouco diferentes. Matam por envenenamento ou outras formas, mas sempre procurando encobrir os crimes. De enfermeiras assassinas, há muitos registros. E há as “viúvas negras”, assassinas em série de uma sucessão de maridos.

Na Indonésia, foi presa uma mulher acusada de matar e comer mais de 30 mulheres jovens e o próprio marido, por um “desejo irrefreável”.

Mas vamos ao tema do título. É normal curtir séries e filmes sobre serial killers?

Antes, uma apresentação: à esquerda, Theodore Robert Bundy, mais conhecido como Ted Bundy; ao centro, Tiago Henrique Gomes da Rocha; à direita, Richard Ramirez.

Em comum, o que chama a atenção nos três é a beleza. Quando o portal americano Gawker mostrou o brasileiro Tiago Rocha, mancheteou: “Serial killer incrivelmente bonito confessa 39 assassinatos”..

Nos comentários, leitores promoveram “mórbido concurso de beleza” entre Rocha e outros assassinos em série famosos, como Richard Ramirez, que matou mais de dez pessoas nos anos 1980, e Ted Bundy, que confessou a morte de pelo menos 30 mulheres na década de 1970.

Os crimes de Tiago Rocha, que incluem a morte a tiros de 15 mulheres e oito homossexuais, entre outras vítimas, foram cometidos a partir de 2011, em Goiânia.

Pois é, os três têm em comum a beleza e a psicopatia. Ted, a exemplo de Tiago, era carismático, mas, ao contrário do brasileiro, tinha estudos: formou-se em Direito e Psicologia. Foi casado mais de uma vez. Era praticamente a à prova de suspeita.

Tiago também era casado e trabalhava como vigilante. Seu padrão de crimes: prostitutas eram esfaqueadas, moradores de rua eram mortos a tiros e homossexuais eram estrangulados.

Bundy, por sua vez, torturava e matava só mulheres, estranguladas ou a golpes. E era necrófilo, como confessou.

Dos três, Ramirez teria o comportamento pior na vida social. Era vagabundo e usava drogas. Matava meio aleatoriamente. 

Os três serial killers, no julgamento e na prisão, recebiam cartas de mulheres apaixonadas. Outro estranho fenômeno do fascínio que criminosos exercem.

Amor mais que bandido

Aliás, Richard Ramirez casou-se em 1996, enquanto estava no corredor da morte, com a jornalista Doreen Lioy. Ela se encantou com ele desde que que o viu pela primeira vez em um programa de TV, após sua prisão, percebendo “seu lado frágil e vulnerável”.

Movida pela compaixão e atração em relação ao assassino, ela lhe enviou 75 cartas e começou a visitá-lo regularmente. Casaram-se e, quando falava dele, Doreen era só elolgios: “Ele é amável, brincalhão e encantador. Acredito que seja uma grande pessoa, é meu melhor amigo”.

Ao contrário de Ted Bundy, eletrocutado, e de Tiago Rocha, que continua preso, Richard Ramirez morreu na prisão, antes de sua execução.

Francisco de Assis Pereira, que ficou conhecido como o Maníaco do Parque, assassinou dez garotas e violentou ontras 11, em São Paulo. Entre 1997 e 1998, ele recebeu em torno de mil cartas só no primeiro mês de sua estadia no presídio onde cumpre pena.

Esta paixão distorcida tem até nome: hibristofilia, termo usado pelos criminologistas. O psicólogo e sexólogo John Money, nos anos 1950. classificou a hibristofilia como uma patologia, ou seja, um dos tipos mais raros de parafilias sexuais (preferências anormais e doentias ou verdadeiros transtornos) que aconteciam, geralmente, com mulheres heterossexuais.

A escritora americana Sheila Isenberg, autora de “Mulheres que Amam Homens que Matam”, entrevistou dezenas dessas mulheres e concluiu que o perfil predominante é o de “meninas perdidas”, moças “danificadas” por infâncias dolorosas. Uma parcela significativa delas tinha um histórico de abuso e relacionamentos violentos e, por isso, vivia em um mundo de fantasia.

Mas nós, os “normais”, que apenas apreciamos assistir a filmes e documentários sobre serial killers e outras psicopatias, não precisamos nos preocupar. Provavelmente, quando alguém matou outro, lá no tempo das cavernas, esse foi o assunto dominante nas rodas de fogueira, sem que o interesse no tema fosse julgado..

Que não se fale só de filmes e documentários. Mesmo os que dizem não gostar, às vezes olham avidamente para a TV quando é contado um caso de crime impactante. E não é à toa que, entre os programas de TV mais assistidos, estão os do chamado “mundo cão”: crimes, sangue, tragédias.

O psicanalista e escritor francês Jacques-Alain Miller tem uma definição por este interesse todo por crimes em geral: “Nada é mais humano que o crime”.

O serial killer que deu origem à série de serial killers

Indo menos longe na história que a era das cavernas, o interesse por serial killers existe pelo menos desde 1880, quando Jack, o Estripador, causou horror em Londres. Depois de matar muitas prostitutas, driblou as investigações e morreu na impunidade. Muitas lendas surgiram sobre ele. E filmes e documentários.

Para a lei americana, serial killer é o homem ou mulher que cometeu “uma série de três ou mais assassinatos em que ao menos um tenha sido cometido nos Estados Unidos, e que tenham características parecidas que sugiram a possibilidade de os crimes terem sido cometidos pela mesma pessoa ou grupo”.

Nós também temos nossos serial killers, como já vimos. Mas a legislação não tem qualquer definição sobre esse tipo de criminoso.

Os “nossos” serial killers

José Ramos, José Augusto do Amaral e Febrônio Índio do Brasil: os mais antigos “serial”.

Sabe-se lá qual a razão, o maior número de serial killers conhecidos foi registrado nos Estados Unidos, Com menos de 5% da população muindial, o país é campeão em killers: 84% de tosos os casos conhecidos, desde 1980, sãode lá. 

Mas que não se despreze nem a ousadia e muito menos a crueldade de brasileiros. Nós também merecemos subir no pódio mundial da matança de pessoas.

Só pra constar, os cinco serial killers brasileiros mais famosos são o gaúcho José Ramos, que em 1863 foi preso acusado de vários assassinatos. O número de suas vítimas é desconhecido, mas seus fregueses logo ficaram sabendo que a famosa linguiça vendida em seu açougue era feita de carne especial – a de seres humanos. Ele tinha ajuda da mulher e de um amigo para atrair as vítimas.

O segundo, José Augusto Amaral, ali por 1898, foi preso em São Paulo acusado de estrangular, estuprar e matar três homens, dois dos quais menores de idade. Ele conquistava as vítimas com uma conversa amigável, pagando um café ou dando um presente, antes de atacar.

Em 1927, Febrônio aterrorizou a população do Rio de Janeiro. Ele dava a si mesmo a alcunha de “Filho da Luz”, pois afirmava estar lutando contra o demônio. As vítimas, depois de estupradas e estranguladas, eram deixadas nuas e com a tatuagem “DCVXVI”. Eram homens, jovens ou crianças., sendo que foram mortas por estupro seguido de estrangulamento.

José Paes Bezerra, o Monstro do Morumbi, e Francisco de Assis Pereira, o Maníaco do Parque.

No final dos anos 1960 e início de 1970, o paulistano José Guerra Leitão assassinou brutalmente sete mulheres e ganhou a alcunha de “Monstro do Morumbi”. Ele levava o dinheiro, as joias e alguma peça de roupa das vítimas, como presentes à esposa, que um dia o denunciou.

Leitão fugiu para o Pará, onde matou mais três mulheres, antes de ser preso e confessar os crimes. Ele disse que matou 24 mulheres, mas foi condenado pelo assassinato de quatro, relacionadas a provas concretas. Pegou 30 anos de prisão e foi libertado em 2001. Nunca mais se ouviu falar dele.

O motoboy Francisco de Assis Pereira atraía mulheres prometendo sessão de fotos para as que pretendiam seguir a carreira de modelo. No Parque do Estado, divisa de São Paulo com Diadema, as mulheres eram estupradas, espancadas e estranguladas. No total, 14 mulheres foram atraídas, mas cinco conseguiram escapar com vida depois de estupradas.

Lidando com a própria agressividade

Voltando ao nosso interesse pelos criminosos em série, o psiquiatra forense Marcelo Caixeta diz que há um consenso entre especialistas de que existem fatores psicopatológicos e biológicos por trás das ações de serial killers.

Para Caixeta, o interesse em criminosos é uma forma que temos de lidar com nossa própria agressividade.

“O homem sente prazer na violência — o sucesso da luta livre e as fantasias sexuais sádicas estão aí para comprovar —, mas existe um limite entre o normal e o patológico. Assassinos em série ultrapassam esse limite”, diz ele.

Isso não quer dizer que sejamos criminosos em potencial, tranquiliza o psiquiatra Daniel Martins de Barros. “O criminoso mexe com a nossa condição. É um cara que faz o que quer e dá uma certa inveja, digamos assim. Ficamos curiosos com o que leva um sujeito a conseguir transgredir essa regra.”

O lado bom da fraqueza

Mas calma, há um outro lado nosso que contrabalança tudo. Ao mesmo tempo que o serial killer nos fascina, a caçada da polícia para pegar um deles também fixa nossa atenção na tela. Ou no noticiário.

“Resolver problemas é uma atividade que traz prazer. Encontrar uma solução de um enigma, resolver um quebra-cabeça traz uma sensação de recompensa”, diz o psiquiatra forense Daniel Martins de Barros.

Mas também tem outro aspecto: ninguém, ao assistir à trajetória de um serial killer, se sentirá na “mira” de um deles. Mesmo que seu perfil seja exatamente o buscado pelo criminoso.

Pelo menos no conforto de nossa poltrona, fica difícil imaginar que um psicopata está à nossa procura. Quer dizer… isso só acontece com os outros e as outras. Todo mundo que conhecemos, afinal, é bem normal!

Fontes: Revista Galileu, JusBrasil, O Tempo, Canal Ciências Criminais, Lifetimeplay, Wikipedia, Megacurioso e documentários Netflix e Prime Vídeo

* Cláudio Dalla Benetta é jornalista em Foz do Iguaçu

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