Miriane Pastoriza diz que Brasil vive momento mais crítico na área da ciência

Cientista esteve em Foz do Iguaçu para visitar atrativos turísticos.

Cientista esteve em Foz do Iguaçu para visitar atrativos turísticos.

O destino de Miriane Griselda Pastoriza foi traçado pelas estrelas. Quando criança, em um povoado pobre de Santiago del Estero, no Norte da Argentina, ela dormia com a família ao ar livre para vencer o sufocante calor de 49°C na região onde não havia nem ventiladores. Foi assim, acostumando-se a olhar para o céu, que aos 8 anos de idade ficou encantada com o amontoado de pontinhos das mais variadas cores, as estrelas.

A curiosidade aumentou depois de ler revistas infantis que traziam conteúdos sobre átomos, física e astronomia. Mas a decisão foi mesmo tomada após um livro do astrônomo Laplace, disponível na biblioteca do povoado onde vivia, chegar às mãos dela. Ao ler a obra, com quase 10 anos, Miriane decidiu: seria astrônoma.

Hoje, professora titular de astronomia do Departamento de Física do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), e membro da Academia Brasileira de Ciências, Miriane é referência na área. Argentina naturalizada brasileira, ela foi a primeira mulher astrônoma graduada pela Universidade de Córdoba. Em 1973, defendeu a tese na área de Astronomia das Galáxias.

Miriane tornou-se professora do UFRGS em 1978, após ter de deixar a Argentina na ditadura. Foi contratada para orientar alunos de mestrados e doutorados. Um dos seus legados na área de atuação é a descoberta e caracterização das galáxias Sérsic-Pastoriza, conhecidas como galáxias com núcleos peculiares. O trabalho foi feito em conjunto com o astrônomo argentino JL Sérsic.

Em outubro, ela esteve em Foz do Iguaçu para visitar as Cataratas e falou com a equipe do H2FOZ, na Livraria Kunda, sobre sua trajetória na astronomia e o momento crítico que a ciência vem enfrentando hoje.

Miriane Griselda Pastoriza em visita à Livraria Kunda, em Foz do Iguaçu – Foto Marcos Labanca

“Esse é o período mais crítico quando se trata em verbas para pesquisas. Mas esse é um problema não só do Brasil, mas de todos os países latino-americanos. Nossos colegas da área da química e biológicas que têm laboratórios estão sem recursos até para pagar a luz. Isso é crítico”, lamenta. A cientista reprova os recentes cortes do governo federal na área da ciência. “Todos os políticos usam celular para mandar mensagens e cortam R$ 600 milhões da ciência.”

Na avaliação de Miriane, há um retrocesso mundial que talvez seja reflexo de um medo ou esforço para seguir avançando. “Até agora quem resolveu os problemas e fez avançar a humanidade foi o trabalho da ciência, para o bem e para o mal”, pontua.

Astronomia – Contrariando posições que criticam investimentos na ciência, Miriane comenta que o objetivo da astronomia é levar o ser humano a conhecer mecanismos físicos que existem nas estrelas e meios intraestelares que permitam ser utilizados no futuro até como fonte de energia. “Todos os elementos químicos que existem na Terra não foram gerados na Terra, foram gerados no Sol, e alguns são remanescentes da nuvem que formou nosso sistema planetário.” Ela ainda ressalta a importância da física: “Se não fosse a física, não existiria o celular, os carros não funcionariam, e os aviões não voariam”.

Um dos alvos atuais da astronomia é entender melhor a chamada matéria escura. Miriane diz que o saber mais sobre a matéria escura vai dar respostas para muitas coisas.

Ela explica que a astronomia é uma ciência mundial, por isso os cientistas trabalham muito em sistema de colaboração e não conseguem fazer muita coisa localmente. Na avaliação dela, a astronomia brasileira cresceu muito. Hoje, há astrônomos do país participando de projetos de observação em grandes centros – Norte do Chile e Havaí.

Pela importância da matéria, os astrônomos fazem atualmente um movimento para incluir a Astronomia Básica no ensino médio. Os conteúdos de astronomia hoje estão dispersos nas disciplinas de física e geografia.

Polo Astronômico – Foz do Iguaçu já foi referência no contexto da astronomia quando funcionava o Polo Astronômico Casimiro Montenegro Filho, no Parque Tecnológico Itaipu (PTI). Inaugurado em 2009, o polo era um centro de cursos para professores e recebia visitas de alunos de escolas públicas, particulares e turistas que visitavam o planetário instalado no local. Também integrava uma rede de pesquisas astronômicas.

Integrando uma rede internacional de observatórios, o polo contribuiu para a descoberta de um sistema de anéis ao redor de um pequeno asteroide chamado Cariclo, que teve destaque na prestigiada revista britânica Nature em 2014.

A estrutura foi desmontada em 2020 com a promessa de ser reaberta no Ecomuseu de Itaipu, que passará por uma reestruturação, porém ainda não há data definida.

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