Casa Escolar Jorge Schimmelpfeng deixou semente da generosidade em Foz do Iguaçu

Prédio construído na década de 1940, ao lado de centro espírita, passa por reparos e abriga memórias de muitos moradores que estudaram lá.

Uma escola de boas histórias. Assim foi a Casa Escolar Coronel Jorge Schimmelpfeng, colégio situado ao lado do Centro Espírita Paz, Amor e Caridade (CEPAC), na Rua Quintino Bocaiuva, região central de Foz do Iguaçu.

Construída para atender crianças de famílias com dificuldades financeiras, a escola foi modelo de educação filantrópica em Foz do Iguaçu. Atualmente passando por reparos, a edificação, da década de 1940, atrai os moradores não apenas por ser antiga. Nas redes sociais, muitos ex-alunos comentam sobre os bons tempos de estudo na Casa Escolar.

O H2FOZ fez uma breve compilação da história da Casa Escolar para os leitores e entrevistou uma das professoras. Boa parte das informações históricas está na página da Federação Espírita do Paraná, em um texto assinado por Enrique Eliseo Baldovino. A direção do CEPAC também contribuiu com informações e imagens desta escola que fez história em Foz do Iguaçu.

Como tudo começou

A Casa Escolar Jorge Schimmelpfeng surgiu por uma iniciativa do CEPAC, que é o primeiro centro espírita de Foz do Iguaçu. O CEPAC foi fundado em 6 de janeiro de 1922, por José Vicente Ferreira, a esposa dele, Celestina Eufrásia Ferreira, e a cunhada, Etelvina Eufrásia da Silva.

A família vivia em Curitiba e, após a mudança para Foz do Iguaçu, começou a reunir-se em casa para evitar a discriminação e a perseguição que pairavam na cidade sobre os espíritas.

As reuniões começaram em 1918. “O espiritismo em Foz do Iguaçu era discriminado, as reuniões eram proibidas, obrigando-os a realizá-las em locais secretos e diferentes para fugirem das perseguições, como em pequenos barcos, à noite, nos rios Iguaçu e Paraná”, escreveu Enrique Eliseo Baldovino na página de Federação Espírita do Paraná.

Como aumentou o número de adeptos às reuniões, decidiu-se fundar o CEPAC quatro anos depois. Em 1924, um episódio mudou a rotina da instituição: Foz do Iguaçu foi ocupada por forças revolucionárias do general brasileiro Isidoro Dias Lopes (1865–1949).

Isso obrigou José Vicente, Etelvina e Celestina, médiuns da instituição, irem embora para Puerto Aguirre, na Argentina, onde ficaram até abril de 1925. Eles retomaram as atividades em Foz do Iguaçu em uma sede provisória do CEPAC, na qual permaneceram até 1938, segundo Enrique.

A atual sede foi construída após o movimento espírita receber a doação do terreno, na Quintino Bocaiuva.

A escola

Casa Escolar Coronel Jorge Schimmelpfeng oferecia uniformes e material escolar. – Foto Arquivo CEPAC


Naquela época, havia muitas pessoas carentes e crianças órfãs na cidade sem acesso ao estudo, o que levou a diretoria do CEPAC a se mobilizar para garantir escola para todos.

Uma ata de 20 de maio de 1945 assinada por José Vicente Ferreira e outros membros da diretoria do CEPAC registra a intenção de enviar um ofício ao então governador do Território do Iguaçu para solicitar um programa de ensino primário.

Ata de 20 de maio de 1945 para tratar da criação da escola


Em 1º. de setembro de 1945, as atividades da escola tiveram início na própria sede do CEPAC com 30 alunos. Foi Lá as crianças começaram a ser alfabetizadas. Na solenidade de inauguração estavam presentes autoridades e 72 associados.

No dia 7 de novembro de 1945, uma carta do CEPAC agradece doação à escola feita pela Cruzada Nacional da Educação. O número de alunos aumentava e chegaram 30 lápis, 30 taboadas e 30 cadernos para atender 43 crianças sem condições financeiras.

Mais adiante o CEPAC, a partir da iniciativa de João Cyríaco de Souza Filho, o Capitão Cyríaco, e de José Vicente Ferreira, decidiu construir, com apoio da comunidade, uma sede própria para a escola. O projeto teve apoio do Lions Clube e de pessoas da comunidade que faziam contribuições mensais com carnê.

No dia 28 de abril de 1947, o CEPAC envia ao então governador Moisés Lupion ofício solicitando auxílio para ampliar o programa de ensino e também informando que a nova sede da escola será concluída até o final de maio daquele ano.

Na ocasião, a Casa Escolar já atendia 70 crianças, das quais 30 órfãs e outras 30 sem recursos financeiros. Assim, a sede própria foi inaugurada em maio de 1947.

Em 12 de dezembro de 1948 foi entregue diplomas a alunos que concluíram o ensino primário, em uma solenidade com presença de autoridades, o então prefeito Júlio Pasa e de professoras do Grupo Escolar Bartolomeu Mitre. Heleno Schimelpefeng, que fazia parte da diretoria do CEPAC, foi o paraninfo da turma e a aluna Elza Maran a oradora.

Alunos no desfile de 7 de setembro. – Foto CEPAC


A escola oferecia uniformes e material escolar. Em 1952, foi fechada temporariamente para reparos. Neste ano, a prefeitura fez a doação de 3120 tijolos para construir o muro na frente da escola. Em 11 de março de 1953, as aulas foram reiniciadas com 73 alunos.

Outro fato relativo à escola foi o funcionamento da Casa da Sopa, entre 1953 e 1958, com o aporte de José Acelino de Castro. A Casa da Sopa fornecia merenda escolar aos estudantes.

Paraguaios e argentinos também estudavam lá, além de muitas crianças que moravam nas proximidades. Em 1963, a escola já contava com 183 alunos do 1º. ao 4º. ano.

A Casa Escolar Jorge Schimmelpfeng foi desativada em 1974 por ter cumprido seu papel. Entre 1989 e 1993, o prédio da escola funcionou como Clube da Criança, em parceria com a prefeitura. Nesse período, a família Savaris estava à frente das ações sociais da instituição.

Atualmente, o prédio histórico passa por reparos com finalidade de conservação.

Professoras

Dileta Maran da Silva foi a primeira professora da escola. Também passaram por lá as professoras Adelina Aguirre, Celeste Sottomaior, Carmem Flitch, Eva Sarza, Lucila Dávalos, Maria Leoni, Maria Dolores Padilha, Maria do Carmo Magalhães e Vitória Weirich entre outras.

Muita gente da geração de 1950 e 1960 que mora em Foz do Iguaçu frequentou os bancos escolares da instituição.

Uma das professoras, Carmem Flitch, falou com a reportagem do H2FOZ. Veja o vídeo.

Ex-aluno, Silvio Campana relembra memórias vividas na década de 60

“Eu tinha 6 anos de idade. Naquela época, a idade mínima para ser matriculado no curso primário das escolas públicas era 7 anos completos. E eu não passei por jardim de infância ou pelo pré-escolar, como chamavam na época, pois tampouco era oferecido.

A estrutura da educação pública era muito pequena na cidade naqueles idos dos anos 60. E, por conta de já estar quase alfabetizado em casa (minha irmã era estudante da então Escola Normal do Magistério e de duas tias já serem professoras), meus pais me matricularam na Casa Escolar Jorge Schimmelpfeng.


A Casa Escolar Jorge Schimmelpfeng era uma iniciativa do Centro Espírita Paz, Amor e Caridade. Escola filantrópica, atendia basicamente crianças da região central, do M’Boicy e da Vila do Sossego (que ficava atrás do então recém-construído Country Clube). Ainda que fosse subordinada à gerência de uma instituição religiosa, o ensino e o calendário naquela escola eram o que hoje eu poderia chamar de totalmente laico.

Eu estudei um ano na Casa Escolar. Lá eu fiz o primeiro ano do chamado primário, em 1967. Minha professora foi Vitória Weirich, já falecida. Ela, por coincidência, também era aluna do magistério, colega de minha irmã, e ministrava aulas para a minha classe. Tenho uma pequena recordação da figura da diretora, senhora Celeste Azambuja Sottomaior, poeta em momentos solenes da escola.

Era uma modesta construção de dois pisos (havia o sótão). O assoalho do andar de cima, em tábuas largas sustentadas por mais madeirame. Minha classe devia ter uns 20 a 25 alunos, não muito mais, pois cabíamos todos no andar de cima da escola, no sótão.

Essa sala tinha acesso por meio de uma escada estreita, também de madeira, instalada em dois lances a partir de um canto na sala térrea. Eram apenas duas salas na época. E a escola funcionava em três turnos. Eu estudava à tarde.

Algumas coisas estão presentes na minha memória depois de tantas décadas. A cartilha Caminho Suave, as aulas de aritmética e o uniforme com as cores da Argentina (a camisa era branca; e a calça, comprida azul-claro). A referência à Argentina, claro, são minhas, pela particularidade da origem de meu avô materno.

No sótão, havia uma pequena sacada, e dali dava para ver o treino do ABC Futebol Clube, cujo campo naquela época ficava localizado na quadra em frente à escola, do outro lado da rua.

Em alguns dias, fazíamos um racha de alguns minutos no campinho improvisado ao lado da escolinha, no potreiro que havia na esquina.

Era o intervalo. Que, mais além do futebol com bola de plástico, ficou marcado pela merenda. Em dias especiais, pão com manteiga e leite. No restante da semana, sopa com pedaços de carne ou frango, e cheiro de aipo norte-americano, servida em pratos com a logomarca do acordo MEC-USAID marcada no fundo.

Muito tempo depois é que fui entender o que representavam realmente aquelas duas mãos entrelaçadas – a do Tio Sam e uma outra –, imitando as estrelas de nossa bandeira. Essa merenda era distribuída pela municipalidade. Imagino que a Casa Escolar também recebia por ser filantrópica, inteiramente gratuita para os alunos.

Em minha memória, o aroma do aipo só perde para o cheiro da terra vermelha misturada com cascalho que subia da rua em frente em dias de chuva.”

Silvio Campana é jornalista em Foz do Iguaçu.

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7 Comentários
  1. Sheila Diz

    Que matéria linda! Sou frequentadora e trabalhadora do CEPAC há 30 anos, desde a adolescência, e é sempre bom ler/assistir matérias que lembram do trabalho social também desempenhado por nosso Centro amado!

  2. Lucia Diz

    Eu estudei lá nunca esqueci saudades. Dá minha infância

  3. Iraci Diz

    Minha 2 irmãs e meu irmão estudaram nesta escola, eu como não tinha nem 6 anos ma época chorava por querer ir escola junto também, e moravamos bem próximo, hoje quando paço em frente fico imaginando a época, era muita pobreza muitos de nós vivíamos em total miséria, mesmo nos termos vindo da roça ñ sabíamos nem pegar num lápis, mas havia amor nas pessoas! Saudades!

  4. Christiano F.Fernandes Diz

    Excelente parte da história desta escola. A Sra. Doraci Rodinski Haus, também trabalhou como Professora. Toda vez que passávamos por lá, ela lembrava. Inclusive com muito orgulho, contava que foi Professora lá do então Secretário Felipe Gonzalez. Todas estas histórias para a gente ver a importância de uma escola nas vidas das crianças!!!

  5. Maria Margareth Diz

    Linda história. Memórias que devemos mantê-las vivas. Ana Martins Alves filha do pioneiro Manencio Martins fez parte da casa da sopa, passou uma vida servindo aos necessitados no Centro onde viveu por muitos anos. Senti um aperto no coração de orgulho em ter vivido um tempo ao lado dela, um exemplo de humildade e bondade.

  6. Mario Escobar Marmo Diz

    Comecei minha vida em Foz, tenho histórias verídicas que daria um livro de 600 páginas, minha família foi pioneira no ramo madeireiro, nosso Porto era onde foi construída a ponte da amizade Brasil Paraguay, tenho muitas fotos raras e crônicas,material farto para ser registrado e passado para gerações, sou Mário Escobar Marmo, ex sócio da sbaraini e ex dono da serraria capacete naGaucha hoje São Miguel do Iguaçu, filho do fundador da madeiras CEMIL, exportadora de toras meu email é escobarmarmo@gmail.com tel 12 981163313

  7. Jamel nissr Diz

    Linda matéria. Chorei pelas lembranças. Estudei alguns dias lá mas ainda em 1968 fui matriculado no São José onde após concluir o primeiro ano primário meu pai me matriculou no Bartolomeu Mitre. Em 1972 fiz o teste de admissão e me transferi para o Monsenhor Guilherme. ÉRAMOS FELIZES E NÃO SABÍAMOS… “É Preciso Amar As Pessoas Como Se Não Houvesse Amanhã…” TIANO, saudades irmão, acho apenas que foi desnecessário citar o “secretário” Felipe Gonzalez! Aproveitando: Quem foram Marechal Floriano, Deodoro, Duque de Caxias, etc… entre outros militares que não significam nada para a cidade serem homenageados com ruas importantes mas os verdadeiros pioneiros serem “esquecidos”? Me perdoem pela falta de modéstia mas se Foz do Iguaçu tem hj a segunda maior colônia árabe do Brasil é graças ao meu pai o Sr Youssif Hassan El Nissr o PRIMEIRO árabe a se estabelecer na cidade. Me perdoem pelo desabafo mas é que os políticos iguaçuense sempre o negligenciaram. Não quero ser arrogante mas se hj minha família é dona de duas esquinas na avenida Brasil é porque meu pai lutou muito por está conquista. Obrigado pai, pena que não soube lhe dar a merecida importância em vida. “Pais e Filhos”… né?

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