Desde 2005, o Parque Remador, no Porto Meira, abriga um mural para estimular a reflexão e engajar a sociedade na luta contra o racismo estrutural. A obra, que expressa o chamado Novo Muralismo, foi elaborada por nove artistas, de vários países, sendo Maria Cheung a representante iguaçuense na composição.
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O mural é uma demonstração de que a arte pode contribuir para promover o pensamento, a reflexão e a crítica sobre temas sociais e políticos, para que a coletividade avance. Se o Brasil foi o país que mais trouxe seres humanos para submetê-los ao escravismo – cerca de um terço de todo esse comércio nefasto –, houve resistência do povo negro, organizado em quilombos.
O país foi o último do continente a eliminar a escravidão, praticada livremente entre os séculos 16 e 19, período em que milhões de homens, mulheres e crianças foram trazidos da África de forma violenta. Não houve indenização ou políticas de inserção do povo negro, injustiça histórica sobre a qual repousa, ainda hoje, o racismo estrutural brasileiro.
O mural contra o racismo no Porto Meira foi visitado pelo músico Gilberto Gil, quando ele era ministro da Cultura (2003 a 2008), durante sua agenda no município. Na ocasião, o artista foi recebido pelo então presidente da Fundação Cultural, Marcelino Vieira de Freitas, dentro da programação local alusiva ao Dia da Consciência Negra.
A reportagem localizou Jose Kura, um dos muralistas que participaram da criação artística em Foz do Iguaçu. Ele vive em Corrientes, cidade argentina que é a capital da província – unidade administrativa correspondente aos estados brasileiros – de mesmo nome, onde realiza encontros e oficinas para difundir a arte pública, entre outras atividades.
“A ideia foi dar uma resposta à temática do racismo, inclusão e direitos”, explicou Jose ao H2FOZ, sobre a proposta de elaboração do mural. O projeto surgiu durante um encontro de muralistas na região fronteiriça, em Puerto Iguazú, na Argentina, momento em que foi realizada a sua terceira edição.
“Esse processo tem a ver com o espírito dos encontros, que é o trabalho coletivo”, expõe. “Os encontros perseguem promover os valores humanísticos da arte, seu compromisso social e político”, explica Jose Kura, que apresenta os temas, os quais passam a ser debatidos pelos artistas para então entrarem na metodologia do fazer criativo, envolvendo conceitos e formas.
Museu a céu aberto
A técnica do mural, explica, é baseada na sobreposição de camadas de rebocos coloridos, trabalhados antes da fixação. Há mais de três décadas atuando nessa linguagem e forma de expressão, o artista destaca a importância desse trabalho para unir artistas e realizar trabalhos acessíveis e dispostos nas próprias comunidades.
“São encontros e não concursos”, frisa Jose Kura, refletindo acerca do aspecto colaborativo e não competitivo das produções como o mural iguaçuense. “Esse trabalho coletivo, de um grupo de artistas criando sobre um tema proposto, democratiza a arte. É um museu a céu aberto”, salienta.
Atualmente, o artista argentino mantém diferentes iniciativas, entre elas a retomada da gestão dos encontros de muralistas. Desenvolve restaurações, produz projetos artísticos autorais e realiza a ilustração de diversos livros, como o trabalho para a capa de uma obra da escritora estadunidense Rose Wildwood.
Arte precisa de cuidados
Nos dias atuais, as condições do mural exigem atenção do poder público. A reportagem constatou que a obra possui vários danos, assim como o muro que a sustenta. A prefeitura foi questionada se prevê revitalização/restauração do mural e qual seria o prazo para essa intervenção.
Por nota, a gestão municipal afirmou que a Prefeitura de Foz do Iguaçu trabalha em um projeto de revitalização do Parque Remador, no Porto Meira, que contempla a reforma do espaço e reforço do muro. Essa ação está sendo conduzida pela Secretaria de Planejamento e Captação de Recursos.
“Os técnicos da pasta estão finalizando o estudo e o apresentarão nos próximos meses”, informa a assessoria. Segundo a administração iguaçuense, ainda, a “licitação da obra deverá ser publicada no segundo semestre de 2023”.
Arte pública
*Fotos: Marcos Labanca/H2FOZ
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