*Este texto contém revelação de roteiro (Spoiler)
O que era para ser, ou parecia ser, uma animação épica de um personagem histórico, revelou-se uma má mistura de Samurai 7 com Gintama, sem humor, sem sequência, sem objetivo. Não conseguiremos, nem com muito esforço, colocar Yasuke, enquanto produção, lado a lado de Afro Samurai.
Yasuke estreou no catálogo da Netflix na última quinta-feira (29 de abril de 2021). Criado por LeSean Thomas, que tem no seu portfólio sucessos como “Avatar: A Lenda de Korra” (2010); e com a voz de LaKeith Stanfield, indicado a melhor ator coadjuvante por “Judas e o Messias Negro” (2021) no Oscar 2021, na versão estadunidense; o anime tem como personagem principal Yasuke, inspirado no personagem histórico Yasuke, único samurai africano do Japão.
Yasuke, forma nipônica do nome islâmico Yosef, também tinha o nome tribal “Makua”. Era de Moçambique e foi levado ao país oriental por jesuítas. Pouco se sabe sobre ele. O que sabemos pelos registros históricos, escritos na maioria pelo missionário jesuíta Luís Fróis, é que serviu sob o daimyō Oda Nobunaga no período Sengoku. Yasuke chegou ao Japão em 1579 a serviço do missionário jesuíta italiano Alessandro Valignano, Visitante de Missões nas Índias. Ele foi um dos muitos africanos que foram com os portugueses para o Japão durante o Período Nanban.
Com quase dois metros de altura, pele negra, musculatura avantajada, Yasuke impunha medo antes da batalha. Não apenas a aparência intimidava mas o domínio magistral da espada que fez história decapitando os inimigos do seu daimyō.
Indo para a crítica, maratonei o anime logo na estréia. É curtinho, seis episódios.
A Netflix precisa aprender a trabalhar animações 2D com 3D. Apesar de ser animado pelo estúdio MAPPA, de Shingeki no Kyojin (Attack on Titan), a aparência do anime está mais para um manhwa, como a maioria dos animes animados por diretores estadunidenses. A arte é bonita mas os movimentos são lamentáveis.
A história se inspira num contexto extraído da biografia de Yasuke, mas vinte anos depois do último registro histórico do Yasuke real e num ambiente completamente “ficcioso”. Nesse sentido assemelha-se de longe com Gintama, que acontece num universo feudal invadido por alienígenas, preservando os personagens históricos da época. Não, em Yasuke não encontraremos ETs, mas mechas. Mechas são aqueles robôs armaduras comuns nas franquias Gundam. Aqui se aproxima de Samurai 7, mas diferente desse que explica patavinas de onde saíram os mechas, em Yasuke eles explicam rapidamente que foi tecnologia usurpada dos mongóis. Ou seja, não consigo descrever minha expressão de quem não vê sentido algum nisso, mesmo se fosse a forma mais bizarra de um provável encontro de Naruto/Boruto com One Peace.
A Netflix tem se esforçado por produzir conteúdo identitário e até com críticas sociais de corte de classe. Em Yasuke debatem a xenofobia mas não chegam a explicitar um contexto de racismo. A proposta do debate é boa e atual. O contexto multicultural das personagens e suas motivações servem de tema para algumas rodas de conversa no bar ou num acampamento de militantes de defesa dos direitos humanos. Não quero imaginar o teor do desenvolvimento de debates em círculos acadêmicos que possam ser inspirados em Yasuke.
Tirando toda decepção pessoal e um salto de roteiro violento no meio do desenvolvimento da história, recomendo enfaticamente assistirem o anime. É divertido e a velocidade da narrativa é ágil e nos proporciona uma boa experiência sobre multiculturalidade.
Mas se querem um anime que expresse de forma magistral e até então final a representatividade negra no contexto otaku, inegavelmente terão que assistir Afro Samurai, com direção de Fuminori Kizaki e produzido por Gonzo em 2007, na voz de Samuel L. Jackson.
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